Análise de Conjuntura – Junho de 2010

30/06/2010
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- Não é documento oficial da CNBB -
 
Apresentação
Nesta análise de conjuntura, focalizaremos a busca por nova configuração mundial. Nesta esteira, as relações Brasil-Irã, analisando os intentos do presidente Lula na construção do acordo com o Irã para evitar as sanções internacionais contra o país iraniano, pela prática do enriquecimento do Urânio a 20%. Em seguida, o eixo será as repercussões da crise financeira internacional na Europa e as medidas mitigadoras que estão sendo tomadas para sua redução, apresentando também os limites e possibilidades das decisões tomadas.
Na esfera nacional abordaremos de forma crítica o papel da mídia no âmbito eleitoral, chamando atenção para as influências que ela busca responder em sua ação neste campo. Destacaremos também os esforços da sociedade por meio da aprovação da Lei da Ficha Limpa, do Seminário em Defesa dos Direitos Sociais e de outras iniciativas, ligadas ao tema da terra e Reforma Agrária, para pauta o debate pré-eleitoral.
Desenvolvemos uma análise rápida do significado da conquista da Lei da Ficha Limpa, a participação da Igreja neste processo, as lições e desafios que se apresentam no horizonte da cidadania brasileira.
Destacaremos sob o olhar dos movimentos sociais, os aprendizados auferidos com a realização da 2ª Assembleia Popular, oriunda da experiência das Semanas Sociais Brasileiras; o andamento da Plebiscito Popular e Abaixo-Assinado pelo limite da Terra no Brasil; os resultados da CPI sobre a Dívida Pública brasileira e necessidade de sua divulgação para que o problema estrutural do endividamento seja enfrentado; os caminhos da CMPI do MST e a denúncia sobre a prisão arbitrária da líder indígena Tupinambá, Glicéria, membro do Conselho Nacional de Política Indigenista, realizada pelo CIMI à ONU.
Concluiremos a análise, apresentando as Notícias do Congresso que trazem reflexões sobre o aumento do número de processos contra parlamentares no STF, conforme levantamento do site “Congresso em Foco”; a decisão do presidente Lula aprovando o aumento de 7,7% para os aposentados e vetando o Fator Previdenciário; as críticas ao substitutivo apresentado pelo relator às alterações no Código Florestal Brasileiro; a aprovação no Senado dos projetos que criam o Fundo Social do Pré-Sal, o regime de partilha e distribuição de royalties do petróleo; o início da tramitação da proposta de criação da Comissão da Verdade na Câmara dos Deputados; a aprovação do Estatuto do Nascituro; a PEC da felicidade; a tramitação do Projeto de Lei para as Religiões; bem como os projetos para regulamentação das Finanças Populares e Economia Solidária, a Lei de Responsabilidade Fiscal e Social e sobre Reforma Política trazidos com pedido de apoio da CNBB pela deputada Luiza Erundina. Ainda serão apresentados o projeto de dedução no imposto de renda de doações feitas a Instituições Religiosas e a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial pelo Senado Federal.
1. Internacional
 
Uma nova configuração mundial?
A globalização econômica tão elogiada como resultante de um mundo unívoco e harmonioso teve como função essencial a legitimação da dominação financeira ocidental, sob o manto de um natural mundialismo. Se a unidade planetária de fenômenos históricos não é novidade, pois toda época passou por certa mundialidade, fica a questão de saber hoje quais são os fenômenos mundiais dominantes e quem está levando vantagem.
Em outras palavras, será que a globalização é fator de paz? A resposta pode parecer escandalosa. Pois, quanto mais os países estão abertos ao comercio internacional multilateral, mais conflitos vão aumentando. A solidez e preeminência dos interesses ocidentais alimentaram ilusões sobre um equilíbrio relativo do mundo. As trocas transatlânticas constituem ainda o motor principal das relações comerciais internacionais, mas a potência americana em declínio tem cada vez mais dificuldade em garantir certa coesão.
A instabilidade da economia americana e o fracasso da sua dominação militar, conjuntamente com a emergência, entre outros países, do Brasil, China, Índia e África do Sul no cenário internacional, econômico e político, revela nova configuração econômico e política que parece pôr em questão a tal “boa governança”. Alianças a direções variáveis caracterizam oscilações entre um equilíbrio antigo e um outro em construção. Face à globalização financeira e sua crise, voltam a vigorar estratégias nacionais e até uma contestação da ordem global na América latina. O grupo constituído por Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC) reivindica oficialmente um novo equilíbrio internacional.
Novas solidariedades, ao mesmo tempo, sustentam e criticam a ordem dominante, como ficou evidenciado no fracasso das últimas negociações do OMC em Doha e da cúpula sobre o clima em Copenhague. Emergem nacionalismos econômicos que se opõem a essa ordem. Assim nasceram a Organização de Cooperação de Shanghaï (OCS) e a Aliança Bolivariana para os povos de nossa América (ALBA) que juntam países opostos à tradicional dominação dos Estados-unidos. Em nome da soberania popular, contestam a supremacia do dólar com a criação do Sistema Único de Compensação Regional (Sucre).
Assim aparece nova mundialidade, quer dizer, um novo caminho comum, com atores aparentemente dispersos.
Relações Brasil-Irã
Afinal, o que os países ocidentais censuraram em Lula? Disseram que o Irã mentiu muito no relatório sobre a energia nuclear. Que Teerã só procura ganhar tempo para continuar seu projeto secreto de fabricação da arma atômica. Que Lula oferece ao presidente Ahmadinejad um apoio inesperado.
O relatório é sensível entre todos, pois, sabe-se, que Israel, por razões de segurança, não deixará Teerã ter a bomba atômica, e que, se for necessário, não duvidará em bombardear as usinas atômicas do Irã. Daí a mobilização total dos EUA.
Por que, então, Lula escolheu essa intermediação delicada, longe da sua zona regional de influência? Como em todas as viagens, tinha interesses econômicos em jogo: um mês antes da viagem de Lula, cem empresários brasileiros foram passar uma semana no país com o ministro do desenvolvimento, Miguel Jorge. A viagem do presidente pode abrir grandes mercados na região. Mas a viagem foi por causa da política: Lula queria expressar publicamente o papel político internacional que ele quer para o Brasil. O presidente deixou um recado: o Brasil é uma potencia, e ele (Lula) quer usar o seu prestigio internacional para expressar sua reivindicação. O recado vale para outros emergentes. O gesto teve o seu impacto – pro ou contra – em nível internacional.
A luta entre o Irã e os EUA e seus aliados, em particular o Reino Unido, a França, a Alemanha e outros países ocidentais começou em 2002 quando ficou mais claro que o Irã tinha um programa nuclear. Ao longo de oito anos, a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) tentou muitas vezes a negociação. Em vão! Os países ocidentais têm o sentimento que o Brasil e a Turquia foram manipulados. Não disse o porta-voz do ministério dos assuntos exteriores o dia mesmo da assinatura do Acordo que o Irã continuaria o enriquecimento do urânio a 20%?
Conforme o Acordo, Teerã ia confiar o enriquecimento do urânio a 20% a outros países, como se renunciava a esse enriquecimento, que é um passo para a arma nuclear. Para os países ocidentais, o Acordo era insuficiente e sem credibilidade, enquanto Teerã não deixava a AIEA controlar a sua realização. Desdenhando o Acordo, na ONU, os EUA continuavam a preparação de sanções, conseguindo o apoio – mesmo que moderado – da China e da Rússia.
O ponto mais fraco da iniciativa de Lula foi o fato dele ter feito uma caminhada solitária. A iniciativa da “última esperança” e o seu “resultado positivo” foi por demais atribuída a Lula mesmo, como se, indiretamente, quisesse dar uma lição a muitos. A melhor diplomacia é lenta e discreta. Talvez o Brasil e a Turquia tivessem conseguido melhores resultados pela ação tenaz e discreta no Conselho de Segurança (CS). Dá para estranhar também que o tão hábil e eficaz ministro das relações exteriores, Celso Amorim, chegue a dizer que o Brasil não pode julgar dos objetivos últimos do Irã.
Esse quarto conjunto de sanções aprovadas pelo CS da ONU não vai resolver nada; muito pelo contrário! Não vão impedir que Teerã continue seu programa. A via do diálogo não pode ser fechada. O Acordo é a melhor chance de prevenir um conflito. O Brasil e a Turquia ainda têm um papel importante no CS em favor do diálogo e da via diplomática.
A Europa em crise
Há de situar a profunda crise financeira que assola a Europa na continuidade da crise mundial dos anos 2008-2009. Naqueles anos, para prevenir o desmoronamento do sistema financeiro, os governos de todos os países deram montanhas de dinheiro aos bancos e outras instituições financeiras. No momento de começar os reembolsos, veio à luz que vários países da União estavam à beira da bancarrota. Entre os dezesseis países da zona-euro, a Grécia era a mais endividada. Antes da crise de 2008, falsificações na apresentação da situação financeira do país ao BCE (Banco Central Europeu) não deixavam aparecer a gravidade da situação. O país estava praticamente insolvente. A situação era grave não só para o país mesmo, mas também para a estabilidade do conjunto da zona-euro.
Pouco a pouco apareceu mais claro que a situação de vários países (Espanha, Portugal, Irlanda em particular), sem ser tão grave como na Grécia, não era nada positiva. Os chefes de Estados ou de governos da zona-euro, reunidos em urgência, atribuíram 40 bilhões à Grécia para evitar a falência, mediante um drástico plano de austeridade. Não bastou para restabelecer a confiança dos investidores (pode-se ler também “especuladores”). Uma crise profunda ameaçava o euro, principal motor da União. Houve uma reação unânime dos governos. Dois dias depois do apoio à Grécia, os 27 chefes de Estados ou de governos criaram o Fundo Monetário Europeu (um tipo de FMI) com uma entrada de 750 bilhões de euros para reconfortar e estimular as economias da União. Os ataques especulativos contra o euro fracassaram, mas a crise não está resolvida, e a moeda comum está bastante enfraquecida.
A crise mostra que o “rei está nu”. O euro não pode funcionar sem a solidariedade dos países. A crise dum só país – um dos menores no caso da Grécia – ameaçava a estabilidade de todo o sistema financeiro. O Tratado de Lisboa atualizou o funcionamento das Instituições políticas, mas não criou instrumentos de governança financeira. Há a necessidade para a Europa de não ficar parada no meio do caminho. O apoio à Grécia e a criação de um Fundo são medidas corajosas, mas insuficientes. A Europa não tem políticas econômicas e fiscais comuns. É uma fragilidade que ameaça a estabilidade do euro.
A Europa vive em cima dos seus recursos. As dívidas se ampliam e se generalizam.
Só uma disciplina fiscal e orçamentária permitirá de pôr um pouco de ordem nas finanças dos países da União. Trata-se de salvar o euro e com ele a vida do projeto europeu comum. A Europa vai viver um período de austeridade. Já vários governos (Espanha, Portugal, Reino Unido) publicaram seus planos para reduzir as suas dívidas. O povo vai pagar: aumento dos impostos, redução dos gastos sociais e do acesso ao crédito. Já há importantes manifestações nas ruas de Atenas e Madri. Pode-se prever um novo período de agitação social e política nos próximos anos.
O euro está em jogo e com ele o futuro do projeto europeu. A Alemanha, principal financiador do FMU, tem inscrita na sua Constituição a exigência do equilíbrio orçamentário. O presidente da França falou de adotar semelhante princípio. Já se fala que a inscrição dele na Constituição dos países possa se tornar uma obrigação para ser membro da zona-euro.
2. Brasil
Mídia, publicidade, comunicação e eleições.
Tudo indica que o processo eleitoral brasileiro, assim como evoluiu dos conchavos políticos para os comícios (sem deixar os conchavos) e depois para os debates (sem deixar os comícios) agora evolui conservando os elementos passados, para o uso da mídia e da publicidade.
Isto inclusive coloca de saída problemas éticos delicados. Nos Estados Unidos, começou um movimento chamado “civic journalism”, entre jornalistas e cidadãos preocupados. Partem de certas convicções: sem ética não se pode falar de vigência da comunicação num processo interlocutório. Como conciliar a sadia (e desejável) disputa democrática, com o princípio de que num contexto comunicativo não há perdedores nem ganhadores? O êxito da comunicação é o sucesso com o outro, não sobre o outro. Trava-se um debate sobre o nível em que a liberdade de imprensa é condição para a livre opinião dos cidadãos. Há certa convergência em que é condição necessária, mas não suficiente. Sem diversidade e pluralidade de fontes de informação, é precária a liberdade de formação de opinião.
Em 1920, Ruy Barbosa criticava num opúsculo o que chamava de “relações imorais” da imprensa com os governos. A seu ver, do lado do poder da máquina (de nomear e demitir, de conceder favores ou preterir pleitos) os governos de plantão tinham o poder de pressionar a imprensa para apresentar os fatos a seu modo.
Ruy não observava isto, mas para “apresentarem os fatos a seu modo” os meios de comunicação nem precisam falsear grosseiramente a realidade: é mais inteligente e eficaz selecionar fatos, silenciando os que não valem a pena, enfatizando (se necessário, fora de proporção) os que interessam.
A crítica sinceramente liberal de Ruy falhava, entretanto, por um lado importante: sem negar o poder que os ocupantes de cargos no Estado possam ter, hoje em dia, certamente o poder maior é dos grandes grupos econômicos (inclusive, sobre o próprio Estado). Dentro de certos limites, a mídia tem que informar o que “os anunciantes querem ver dito”, “tem que ocultar o que não corresponde aos seus interesses”. O critério daquele “preterir” ou “enfatizar” é o que mais ajuda para a renda que os órgãos de comunicação auferem da publicidade; quando não a parcela acionária dos grandes grupos na própria mídia (escrita, falada, televisiva).
A mídia tem o poder de noticiar-se a si mesma, isto é, de noticiar o que aparece na mídia. Exemplo ilustrativo, é o dos “dossiês” anunciados e denunciados que não aparecem. Pode até bem ser que alguns existam; mas que a publicação deles causasse impacto menor e mais breve do que os comentários e notícias sobre as notícias e comentários referentes a eles (quando, por exemplo, se denuncia a intenção de denúncia). Estes (comentários e notícias) chamam mais atenção sobre suspeitas e dúvidas do que sobre fatos, mas podem ser mais poderosos, porque chamam atenção maior, mais longamente, de mais gente.
Fala-se da internet como “ágora eletrônica” aberta à participação cidadã e isto dá certa ilusão de universalidade. De fato às vezes não se leva em conta o nosso “duplo nível de analfabetismo”: o da massa que não sabe ler e escrever, mas também o da segunda faixa que sabe ler e escrever, mas não tem acesso ao computador e às técnicas de seu uso.
O grande destaque das eleições deste ano pode vir a ser a campanha digital (pela internet). A ideia é usar as chamadas mídias sociais (Orkut, facebook) para levar os candidatos e candidatas diretamente às pessoas, driblando o noticiário da grande imprensa.
Blue State Digital é a empresa norte-americana que fez (na internet) a campanha de Obama a partir de uma leitura similar, de que a grande imprensa nos Estados Unidos favorecia os republicanos. A agência Pepper assumiu a campanha digital de Dilma. Há um contrato pelo qual a Blue State fornece consultoria à Pepper e esta a representa na América Latina, especialmente no Brasil. Os analistas, amigos e adversários, tendem a concordar em que a campanha digital foi decisiva para a vitória de Obama.
A experiência da “Ficha Limpa” e de outras campanhas sugere para se contribuir para uma sociedade melhor, mais participativa e humana, que se tente mobilizar a rede de comunicação disponível (rádio, TV, internet) para um “observatório” permanente. Mas que não seja algo pontual e espasmódico, nem se reduza a estimular o voto em gente honesta e competente; e sim acompanhe a atuação de cada parlamentar, prefeito, governador, por exemplo. Ou seja, conectar as experiências pioneiras de grupos locais de acompanhamento do Legislativo e Executivo, através da rede de comunicação.
Na perspectiva de influenciar a pauta de debates das próximas eleições o Movimento em Defesa dos Direitos Sociais (do qual participam as Pastorais Sociais, CBJP, Grito dos Excluídos e Campanha Jubileu Sul, membros do Programa Justiça Econômica) realizou Seminário Nacional no dia 17 de junho, em Brasília acerca dos temas das Políticas vinculadas à Seguridade Social e a questões agrárias, concluindo com o diálogo com responsáveis pelos programas de governos das candidaturas à presidência da República.
Chama atenção a ausência do tema sobre a terra e Reforma Agrária nos debates pré-eleitorais, enquanto a sociedade brasileira se mobiliza em favor da tramitação no senado da PEC 438/2001 contra o Trabalho Escravo (280 mil assinaturas foram apresentadas no dia 26-05-2010 ao presidente da Câmara dos Deputados); a CNBB realizou o estudo sobre a questão agrária em sua 48ª Assembleia Geral e os movimentos sociais organizam o Plebiscito sobre o tamanho máximo da propriedade da terra no Brasil em 35 módulos fiscais.
Ficha Limpa: que fenômeno foi esse?
Com a resposta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às consultas realizadas por parlamentares do Congresso Nacional, como a da última quinta-feira, dia 17/06/2010, consolida-se a plena aplicação da Lei Complementar nº 135/2010, de 04-06-2010, conhecida com a Lei da Ficha Limpa. A decisão proferida afirma que os novos critérios de inelegibilidade serão aplicados para as eleições desse ano e que os fatos da vida pregressa dos candidatos serão considerados, analisando-se caso a caso, quando pairar dúvidas. É sem dúvida, uma vitória da sociedade brasileira.
O MCCE acertou, e em seu seio, reconhecidamente a atuação da CNBB foi acertada. Visto que se afastou da campanha difamatória acerca da atuação dos políticos, colocando-se na perspectiva pró-ativa de afastar da política, aqueles agentes públicos que demonstraram não serem confiáveis pela análise da história de sua vida pública. Foi um passo edificante na valorização da política como o meio pacífico para resolução dos conflitos numa democracia.
Foi também a concretização dos diversos apelos que a Igreja Católica no Brasil sempre faz com seus documentos e declarações, oferecendo suas orientações para o voto consciente, quando insistia na observância da história de vida dos candidatos e dos partidos como critério para discernimento do voto.
Muitos duvidavam da possibilidade de o Congresso Nacional “cortar na própria carne”, uma vez que vários políticos com os novos critérios ficarão fora da próxima disputa eleitoral. Quais lições podemos tirar dessa iniciativa vitoriosa?
Primeira, a unidade na decisão, empenho efetivo e diálogo construtivo. Unidade que se iniciou na Assembleia da CNBB em abril de 2008 e que se manteve quando as propostas de mudanças na proposta inicial foram oferecidas. Empenho efetivo na coleta das assinaturas, com a seriedade da identificação do eleitor(a), por meio de seu título de eleitor, e nas várias iniciativas pessoais e coletivas de coleta de assinaturas. E que prosseguiu nas ruas e pela internet quando o Projeto não tramitava na Câmara dos Deputados. E diálogo construtivo entre a Sociedade Civil e Congresso Nacional, que escutou em audiência pública a sociedade civil para o início das atividades do Grupo de Trabalho para conhecer as razões mais profundas do “Ficha Limpa”, acrescentando contribuições importantes no aperfeiçoamento da proposta. Esse diálogo pode ocorrer pela autonomia que o movimento social tem em relação às várias esferas do Estado e dos partidos.
Segunda, é preciso mencionar também que a denúncia do terrível esquema de corrupção eleitoral em curso no Distrito Federal, envolvendo os vários poderes locais constituídos da Capital da República, com o afastamento do próprio Governador, conhecido pela operação “Caixa de Pandora” e a resistência da juventude no afastamento dos envolvidos criou ambiente nacional que tornou inexorável a aprovação do Ficha Limpa pelo Congresso Nacional. Neste aspecto a cobrança efetivada pela mídia cumpriu papel fundamental.
Terceira, mas não mesmo importante, foi realizar a grande mobilização da indignação da população brasileira com os desvios éticos na política para algo construtivo, por meio da educação política, realizada com a reflexão desenvolvida no âmbito das iniciativas da Campanha da Fraternidade de 2009, que colocou a adesão à iniciativa popular como ação concreta no Agir daquela CF. Traduzir um procedimento jurídico eleitoral em termos compreensíveis foi a “pedra angular” da conquista da Lei da Ficha Limpa. O povo entendeu a iniciativa proposta, se apropriando uma pouco mais do processo eleitoral. Não se pode esquecer que bebemos da sabedoria da aprovação da Lei 9840/99, conhecida como Lei dos Bispos, contra a compra de votos e uso da máquina administrativa nas eleições e da sua efetividade: até as eleições de 2008, 960 políticos cassados!
Com a ampla mobilização social e aprovação da Ficha Limpa em tempo considerado recorde, a própria CNBB e o MCCE têm sido procurados para avalizarem novas iniciativas populares, principalmente no que tange à Reforma Política. Permanece o desafio de “traduzir” as propostas em termos compreensíveis e construir unidade em torno do tema, lições indispensáveis para uma nova empreitada! Cresce a importância do Documento 91 da CNBB – “Por uma Reforma do Estado com Participação Democrática”, aprovado no Conselho Permanente de março e da cartilha “Eleições 2010: o chão e o horizonte” para a educação para o voto consciente nas próximas eleições, bem como na construção de novas iniciativas de fortalecimento da democracia brasileira.
A entrega pelo presidente do TCU ao Presidente do TSE do nome de 4.922 gestores públicos que tiveram suas contas rejeitadas pelo TCU estimulou para que outros órgãos colegiados também analisem que contribuições podem dar para efetivação maior da Ficha Limpa a partir das eleições de 2010. Acredita-se que o impacto maior dessa relação venha a ocorrer nas eleições municipais de 2012.
3. Movimentos Sociais
II Assembleia Popular Nacional
Foi realizada em Brasília, de 25 a 28 de maio, a II Assembleia Popular Nacional, que reuniu em Luziânia (GO), cerca de 500 representantes de pastorais sociais, entidades e movimentos sociais de todo o país.
Esta foi a continuidade da construção coletiva, e a partir da base, de um Projeto Popular para o Brasil. Este projeto possui uma característica central e singular: a unidade na diversidade. Possui também uma raiz histórica qualificada: os processos das quatro Semanas Sociais Brasileiras, coordenadas pela CNBB, dos anos 90 aos princípios do século XXI.
A legitimidade e a riqueza da Assembleia Popular vêm da sua proximidade e enraizamento nas bases e nos setores excluídos da sociedade. Este processo e este lugar social propiciaram diversos acúmulos e uma lúcida abrangência da análise: a noção de biomas; de eixos de análise com base nos direitos; da dimensão ambiental e climática; a concepção de modelo civilizatório.
A Assembleia Popular é a resposta de pastorais sociais e movimentos populares à crise civilizatória e à crise do Estado atual. Estes setores estão sendo protagonistas políticos ao se lançarem o desafio da construção de um novo modelo civilizatório e de um novo tipo de Estado. Para tanto, se abrem às contribuições dos povos indígenas e das populações tradicionais, que constituíram sociedades baseadas no equilíbrio interno e na convivência harmônica com a natureza.
A II Assembleia Popular Nacional foi um momento forte, que aliou a crítica contundente ao modelo econômico, político e social atual à troca de experiências de base na construção do novo.
Qual teria sido o desafio central que emergiu naqueles dias, para a continuidade desta construção coletiva? O grande desafio nos pareceu o de continuar assimilando as diferentes contribuições de pastorais e movimentos populares num todo integrado, em termos de método e conteúdos: do trabalho de base; da formação política e da construção teórica do “Brasil que queremos”.
Com qual sentimento de pertença poderemos continuar esta construção conjunta? É evidente que um processo complexo como este, reunindo diferentes atores, com diferentes histórias e inserções sociais, acaba por desencadear também tensões e dificuldades.
Este desafio central nos remete a um outro quadro referencial, mais profundo, que deve fazer parte da própria matriz do nosso Projeto Popular comum: o nosso quadro de valores, base das nossas atitudes, ações e práticas organizativas e políticas.
Elencamos aqui, entre valores, atitudes e ações relevantes: democracia; respeito ao outro; diálogo e intercâmbio; humildade; generosidade; construção conjunta; capacidade de autocrítica; abertura para a dimensão subjetiva, cultural e espiritual da luta social; a dimensão utópica.
As pastorais e os movimentos sociais tiveram uma experiência importante nos anos 70 do século passado: foi a do encontro das práticas da Igreja Católica - e de outras Igrejas – das CEB’s e movimentos populares emergentes, com militantes que provinham das organizações de esquerda, que saiam das prisões, que voltavam do exílio.
Foi, naquele momento, um encontro fecundo para todos, pois havia a sede de conhecimento e de preparo político por parte dos setores populares e a abertura, por parte dos militantes, para conhecer e contribuir com a nova prática social então em processo.
Houve uma valorização mútua e um profundo sentimento de respeito; havia uma humildade dos militantes de esquerda, baseada na autocrítica do “vanguardismo” dos anos 60 e 70; havia, por outro lado, uma busca de superação do “basismo” por parte das pastorais e Igrejas, que reconheciam a complexidade da sociedade brasileira e o enorme desafio de construção de estratégias de transformação social a partir dos mais pobres.
O processo de construção da Assembleia Popular poderia se inspirar naquele momento histórico, para construir um novo crescimento das lutas sociais no Brasil e um novo Projeto Popular, que seja nosso referencial comum, com trabalhos de base e de formação política complementares.
Destacamos aqui que este processo só poderá acontecer, de maneira profunda e verdadeira, com a introjeção, pelo conjunto da militância da Assembleia Popular, dos valores centrais da humildade e da generosidade.
É, também, importante assumir as avaliações e autocríticas do passado, para não repeti-lo; assim como recuperar o que foi correto e fecundo no passado para os setores populares, para fortalecer hoje seu protagonismo e renovar suas vitórias.
Plebiscito Popular e Abaixo-Assinado para Emenda Constitucional pelo Limite da Terra
As entidades que integram o Fórum Nacional da Reforma Agrária e justiça no campo diante da expansão dos latifúndios e das monoculturas conduzem desde o ano 2000 a Campanha pelo limite de propriedade da terra em defesa da reforma agrária e a soberania alimentar e territorial. Conclamam agora a sociedade e contam com o apoio da Igreja para a realização de um Plebiscito de iniciativa popular que tem por objetivo final uma emenda constitucional que inclua um novo inciso no Art. 186 da Constituição Brasileira onde se trata da função social da terra. A emenda pretende estabelecer o limite ao tamanho máximo da propriedade em 35 módulos fiscais, medida já sugerida pela Campanha do Fórum Nacional pela Reforma Agrária.
A Igreja Católica no Brasil, através da ação da CPT e a dedicação de bispos, padres, religiosos, religiosas e um grande número de leigos e leigas que sacrificaram suas vidas, há décadas vem afirmando a urgência da reforma agrária e apoiando as lutas do povo pela justiça no campo. Essa reforma é uma exigência ética de um desenvolvimento humano integral para todas as pessoas no nosso país e já não está mais nos planos dos governos. O plebiscito de iniciativa popular pretende pautar o tema da reforma agrária na agenda e nos planos dos próximos governos. 
As Igrejas membros do CONIC assumiram o compromisso de apoiar a iniciativa do plebiscito popular na Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2010, cientes de que a maioria das pessoas que lutam pela justiça no campo são fiéis cristãos que esperam a cooperação de todas as Igrejas e da sociedade brasileira.
CPI da Dívida Pública Brasileira
Em 2009 o pagamento de juros e amortizações da dívida brasileira (interna e externa) consumiu R$ 380 bilhões, equivalentes a 35,57% do Orçamento Geral da União executado. Observe-se que nesse montante não esta incluída a “rolagem”, ou seja, o pagamento de principal (amortizações) por meio da emissão de novos títulos. Essa sangria de recursos para pagar dívida tem impedido a realização de investimentos. Os recursos dos tributos pagos pela sociedade estão sendo drenados para a dívida e não para a melhoria dos serviços de saúde, educação, segurança, infra-estrutura, entre outras políticas públicas.
Há um jogo financeiro. A propaganda de que “não devemos” encobre a verdade. Os números mostram a barbaridade a que chegamos: Dívida Interna já ultrapassou o patamar de R$ 2,15 trilhões; Dívida Externa de US$ 282 bilhões e o “mercado” colocando o Brasil de joelhos para cumprir os compromissos de juros que vencem todos os dias. A taxa de juros SELIC acaba de se elevar para 10,25% e há vários meses o Tesouro Nacional vem leiloando os títulos da dívida interna prefixados a 13%. Esse fato é decorrente da pressão pré-eleitoral exercida pelo “mercado”, pois sabe que todo governante fará tudo para evitar uma moratória no final de seu mandato. FHC chegou a pagar juros de 20% em 2002 e teve que recorrer ao FMI. Até quanto vão exigir de Lula?
O Brasil continua pagando uma dívida externa, que alcançou o patamar de US$ 282 bilhões em 2009, apesar da propaganda de que somos credores, inclusive perante o FMI. Há um grande equívoco em deduzir que “a dívida externa acabou” ante a simples comparação entre o atual montante da dívida externa e o imenso volume de reservas internacionais acumuladas pelo Brasil, em torno de US$ 250 bilhões atualmente.
Em primeiro lugar, tal simplificação leva a uma distorção de nossas reais obrigações e compromissos com o exterior, pois a dívida externa não é o único componente do passivo externo brasileiro[1]. Em segundo lugar, a dívida externa nos obriga ao pagamento de juros e demais comissões e taxas que representam um custo anual de cerca de 10%, em média, ao passo que as reservas internacionais encontram-se, em sua grande maioria, aplicadas em títulos da dívida norte-americana que não rendem quase nada. O mais grave é que para acumular esse enorme “colchão” de reservas, desde 2006 o Brasil tem emitido grande quantidade de títulos da dívida interna para atender ao apetite dos investidores internacionais que buscam aqui as maiores taxas de juros reais do mundo, além de moeda que se valoriza frente ao dólar, isenção tributária e total liberdade de capitais. Só recentemente o ingresso de capitais passou a ser tributado em 2% a título de IOF, o que é desprezível se considerarmos que o ganho real dos estrangeiros que investiram em títulos da dívida interna em 2009 chegou a alcançar 50%![2] Portanto, apenas mudamos de credor, pois continuamos pagando não ao FMI, mas a esses novos credores, a juros altíssimos, muito mais onerosos do que o que pagávamos ao FMI.
A recente CPI da Dívida Pública na Câmara dos Deputados apontou sérios indícios de ilegalidades e ilegitimidades no endividamento público brasileiro que demandam o aprofundamento das investigações.
O próprio Relator indicado pelo Governo (dep. Pedro Novais – PMDB/MA) reconheceu que falta transparência, que o valor dos juros pagos não é devidamente divulgado, e que a dívida atual é produto principalmente da aplicação de taxas de juros “não-civilizadas”, consumindo mais de um terço dos recursos do Orçamento Geral da União – 35,57% - enquanto áreas sociais fundamentais consomem muito menos, como saúde (menos de 5%) e educação (menos de 3%).
Portanto, a CPI provou que a elevada dívida pública representa o custo da política econômica (monetária e cambial), ao contrário do que pregam certos meios de comunicação segundo os quais tal dívida decorreria de uma suposta “gastança” com servidores ou Previdência Social.
A aplicação de juros sobre juros (“anatocismo”) foi considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal, constituindo-se, portanto, em um dos mais graves indícios de ilegalidade da dívida interna, conforme constou do Voto em Separado apresentado à CPI pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL/SP). O referido deputado também denunciou o evidente “conflito de interesses” decorrente da participação direta dos representantes do mercado financeiro na definição da expectativa de inflação que rege o aumento das já elevadíssimas taxas de juros brasileiras[3].
A CPI da Dívida Pública obteve vários documentos que respaldam a necessidade urgente de realização de uma completa auditoria dessa dívida, que não tem significado qualquer benefício ao país, mas tem sido um instrumento de transferência de grande volume de recursos públicos para o setor financeiro privado. Enquanto isso se aprofunda a dívida social e a negação a direitos sociais básicos à maior parte da população, avolumando-se as injustiças que fazem crescer a violência em nosso país.
Como enfrentar essa situação? O primeiro passo é conhecer a realidade dessa dívida: como ela surgiu e como chegou a essa situação exorbitante, apesar de décadas de pagamentos excessivos a título de juros e amortizações, além da entrega de quase todo o patrimônio nacional por meio das privatizações. O instrumento para o conhecimento da dívida é auditoria. Este procedimento foi previsto na Constituição Federal de 1988 (nunca cumprido), mas já aplicado no passado, no governo Getúlio Vargas, quando se obteve redução de cerca de 40% tanto do estoque da dívida como do fluxo de pagamentos. É uma reivindicação do Movimento pela Auditoria Cidadã da Dívida que integra o Jubileu Sul Brasil, iniciado no ano jubilar de 2000.
 O Equador realizou uma auditoria oficial da dívida pública entre os anos 2007 e 2008, e conseguiu reduzir em 70% o estoque da dívida com os bancos privados internacionais. Um dívida de 4 bilhões de dólares passou para 1 bilhão de dólares. Este é um bom exemplo para o Brasil, visto que também o Brasil tem um montante significativo da sua dívida comprometida com os bancos privados internacionais. O Presidente, Rafael Correa, frente ao informe da Auditoria da Dívida Pública, disse que vai tomar "ações penais contra os que venderam a pátria, contra os que se venderam e haverá ações administrativas e civis para buscar a nulidade da dívida ilegítima".
CPMI do MST
Aproxima-se, talvez, de seu final, o trabalho da CPMI do MST (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito), que vem investigando os convênios realizados e as respectivas transferências de recursos financeiros, por parte de órgãos federais, para entidades que realizam ações junto a assentamentos de Reforma Agrária, particularmente aquelas relacionadas com o MST, o Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
Durante os últimos meses foram realizadas muitas sessões da CPMI no Congresso Nacional, nas quais foram ouvidos - e longamente inquiridos - representantes de diversos Ministérios (Desenvolvimento Agrário, Saúde, Educação, Meio Ambiente, Cultura, Direitos Humanos) que possuem parcerias e convênios com aquelas entidades de Reforma Agrária; membros destas entidades; lideranças camponesas do MST; especialistas nas questões agrária e agrícola no país, entre outros segmentos.
Nestes depoimentos foram fornecidas, aos deputados e senadores membros da CPMI, fartas informações com relação aos projetos que vêm sendo realizados em ações da Reforma Agrária pelo Governo Federal; com relação à fidelidade de tais projetos com os convênios assinados com as entidades da Reforma Agrária; assim como com relação aos resultados e metas obtidos e sua relação com os resultados e metas que tais entidades se propunham atingir, declarados nestes convênios.
A oposição, de início muito ativa na CPMI, aos poucos foi deixando de participar ativamente, ficando poucos de seus membros presentes na totalidade das sessões ordinárias e mesmo nas audiências importantes. Frente à abundância de informações sobre os convênios celebrados; sobre a sua efetiva realização nos assentamentos de Reforma Agrária e sobre os resultados comprovadamente positivos alcançados em diversas áreas como produção, renda, saúde, educação, os parlamentares de oposição parecem ter perdido o interesse em participar.
No entanto, estão nas mãos da Presidência da CPMI mais de uma centena de requerimentos solicitando a quebra dos sigilos bancário e telefônico de membros de entidades da Reforma Agrária e de lideranças do MST. Durante as próximas duas semanas do mês de junho, veremos se a CPMI do MST irá se encerrar, como as três que a antecederam, sem comprovar nenhuma das suspeitas de desvio de recursos públicos que as originaram ou se, pelo contrário, continuará nos próximos meses, trazendo informações destas outras CPMIs anteriores e conformando mais um palco para a disputa eleitoral em curso.
Denúncia pede intervenção da ONU para libertar índia presa
O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e a organização não-governamental Justiça Global no dia 9 de junho, à Organização das Nações Unidas (ONU), uma denúncia acerca de uma ação de agentes da Polícia Federal contra índios da etnia Tupinambá, no sul da Bahia. No documento, pedem a intervenção da ONU para a imediata concessão da liberdade à índia Glicéria Tupinambá. A denúncia foi veiculada pela Rádio Vaticano, no dia 18-06-2010, às 18h34.
A índia integra a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) e está presa desde o dia 2 de junho, sob alegações questionáveis. O CIMI e a Justiça Global querem garantias de vida e de terras para a etnia Tupinambá.
 A prisão de Glicéria é relatada na denúncia enviada nesta quarta-feira, dia 9, à ONU. Além de pedir a imediata libertação da índia, o CIMI e a Justiça Global pedem a garantia imediata da posse do território reivindicado pelo povo Tupinambá, com a conclusão do processo demarcatório, processo já iniciado pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
 Outro pedido feito pelas entidades é a garantia da integridade física dos índios e que a Polícia Federal dê noções de direitos humanos aos agentes que tratam com povos indígenas e outras minorias étnicas.
 No documento, as entidades também pedem uma investigação para identificar os agentes da Polícia Federal que teriam cometido crimes de tortura contra cinco índios Tupinambá: Ailza Silva Barbosa, Alzenir Oliveira da Silva, Calmerindo Batista da Silva, Mário Oliveira Barbosa e José Otávio de Freitas.
4. Notícias do Congresso
Dobra número de processos contra parlamentar no STF
            O número de processos contra deputados e senadores em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) dobrou desde o início da atual legislatura. O total de investigações envolvendo deputados e senadores saltou de 197, em abril de 2007, para 397, conforme levantamento exclusivo do site Congresso em Foco, concluído no último dia 30/05. Nesse mesmo período, subiu de 101 para 169 a relação dos congressistas que estão na mira da mais alta corte do país. Ou seja, de cada sete parlamentares, dois têm contas a ajustar com a Justiça. Entre as denúncias mais frequentes contra deputados e senadores, estão as de crime de responsabilidade (praticados no exercício de outra função pública), peculato, formação de quadrilha, crimes eleitorais, ambientais, contra a ordem tributária e a Lei de Licitações. Também há acusações de crimes contra a honra, como calúnia, infâmia e difamação. O desfecho da legislatura com o dobro de pendências judiciais é alarmante. O cupim da corrupção não pode seguir corroendo o Estado e a Lei Ficha limpa é o primeiro passo para a moralização. A lei da Ficha limpa tira da vida política, por oito anos, os políticos com condenações. Isso deve ser atribuído como algo positivo. Pois poderemos tirar da política, mesmo que temporariamente, aqueles que não agiram da forma mais adequada no exercício do mandato. Daí a importância doa Lei “Ficha Limpa” (tratado à parte).
 
Lula mantém reajuste de 7,7% para aposentados
            O presidente Lula decidiu manter o reajuste de 7,7% para os aposentados que recebem mais de um salário mínimo e vetar o fim do chamado fator previdenciário. As duas mudanças foram feitas pelo Congresso durante a votação da Medida Provisória 475/09, que previa aumento de 6,14% para as aposentadorias. O anúncio da posição do presidente foi feito pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que defendia o veto de Lula às duas alterações. A decisão ocorreu após reunião de mais de quatro horas com a equipe econômica do governo, além do ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas, e o líder do governo na Câmara, Cândido Vacarezza. Lula acabou aprovando o reajuste em ano eleitoral.
 
Sob críticas, relator apresenta proposta de alterações no Código Florestal
O substitutivo do deputado Aldo Rebelo aos projetos que reformam o Código Florestal (Lei 4.771/65) foi duramente criticado em notas técnicas apresentadas pelo PV, PSOL e pelo Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União.
O parecer agradou a bancada ruralista, mas recebeu críticas duras dos parlamentares e das entidades ambientalistas. A avaliação dessas entidades é que o texto representa um retrocesso na proteção ambiental. Um dos pontos mais criticados é a ampliação da autonomia dada aos estados para legislar sobre meio ambiente. O texto do relator delega a estados e municípios a prerrogativa de fixar os limites de Áreas de Preservação Permanente e reservas legais. Aldo Rebelo afirmou que cada estado tem especificidades que devem ser respeitadas. Ainda não é claro o resultado final das votações e muita água pode passar por baixo da ponte.
 
São aprovados no Senado Projetos que criam o Fundo Social do Pré-sal, regime de partilha e distribuição dos 'royalties' do petróleo
            O Senado aprovou, na madrugada do dia 10 de junho, o substitutivo do senador Romero Jucá ao projeto de lei do Executivo que cria o Fundo Social do Pré-Sal (PLC 7/10). A matéria - que recebeu 38 votos favoráveis, 31 contrários e uma abstenção - retornará para analise da Câmara, uma vez que os parlamentares também aprovaram emenda do senador Pedro Simon que distribui os royalties do petróleo entre todos os estados e municípios, estabelecendo que a União compensará os estados produtores - Rio de Janeiro e Espírito Santo - pela perda de recursos.
            A emenda de Simon foi aprovada por 41 votos favoráveis e 28 contrários. O relator da matéria e líder do governo, Romero Jucá, afirmou, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá vetar essa determinação. Também foi aprovada emenda resultante de acordo entre os senadores destinando 50% dos recursos do Fundo Social para a educação pública superior e básica. A emenda determina ainda que, do total, 80% dos recursos precisam ser aplicados na educação básica. O Fundo Social é um mecanismo de natureza contábil e financeira, vinculado à Presidência da República, com a finalidade de constituir fonte de recursos para o desenvolvimento social e regional, na forma de programas e projetos nas áreas de combate à pobreza e de desenvolvimento da educação, da cultura, da saúde pública, da previdência, da ciência e tecnologia, do meio ambiente e de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
 
Comissão da Verdade começará a ser analisada pela Câmara
            O presidente da Câmara, Michel Temer, determinou a criação de Comissão especial para analisar o Projeto de Lei 7376/10, do Executivo, que cria a Comissão Nacional da Verdade. Os partidos deverão agora indicar os membros. Depois da análise pela comissão, a proposta será votada pelo plenário. A proposta prevê que a Comissão será criada no âmbito da Casa Civil da Presidência da República para esclarecer casos de violação de direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988 – inclusive a autoria de tortura, mortes, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres. O projeto estabelece que a comissão terá sete membros indicados pelo presidente da República e dois anos para produzir um relatório, com conclusões e recomendações, mas sem caráter punitivo.
            A Comissão Nacional da Verdade foi proposta na terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos, com o objetivo de promover o direito à memória e à verdade. O programa recomenda a implantação de 521 iniciativas, que exigirão o envio de 27 projetos de lei. A proposta que cria a comissão é o primeiro encaminhado ao Congresso após o lançamento do PNDH-3.
            Quanto às alterações realizadas pelo Governo Federal no PNDH-3, houve a supressão da ação programática sobre a retirada dos símbolos religiosos de estabelecimentos públicos da União; quanto aos demais temas, retornou-se a formulação do PNDH-2, mantendo-se, assim, a crítica à visão antropológica que perpassa os vários PNDH, realizada na Declaração sobre o tema durante a 48ª Assembleia Geral da CNBB.
 
Comissão da Câmara aprova Estatuto do Nascituro
            A Comissão de Seguridade Social e Família, da Câmara, aprovou o substitutivo ao Projeto de Lei 478/07 da deputada Solange Almeida, dos deputados Luiz Bassuma e Miguel Martini, que cria o Estatuto do Nascituro. O texto define que a vida humana começa já na concepção. Houve acordo na comissão e a relatora ressaltou, em seu substitutivo, que o aborto nos casos de estupro e de risco de vida para a mãe continua legalizado.
 
A felicidade serve como uma “cola para unir”
            A felicidade serve como uma cola para unir e, ao mesmo tempo, despertar os direitos sociais previstos na Constituição brasileira. Essa é a análise do senador Cristovam Buarque, ao apresentar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que garante aos brasileiros o direito à busca da felicidade. A PEC é iniciativa do Movimento + Feliz, ao qual já aderiram várias personalidades e artistas. A CNBB, em audiência pública, apresentou uma avaliação crítica da proposta, uma vez que os movimentos sociais não estavam representados na proposição e que a campanha tinha fortes traços de “campanha de marketing”, apresentando-se vazia de objetivos e conteúdo.
 
Projeto de Lei (PL) para as Religiões
            Dispõe sobre as Garantias e Diretrizes fundamentais ao livre exercício da Crença e dos cultos religiosos. Trata-se da negociação feita com os evangélicos por ocasião da votação do Acordo Brasil-Santa Sé. Este PL já começou truncado, mas foi logo aprovado na Câmara. Está em processo de votação na Comissão de Educação e Cultura do Senado e deverá ainda passar pela Comissão de Assuntos Econômicos e de Constituição e Justiça. Quando discutido pela primeira vez, houve solicitação de audiências públicas. De fato, só houve uma e não bem sucedida. A questão central: dentro da laicidade do Estado, o legislativo pode ditar leis para as Igrejas? Isto deverá dar grande discussão na Comissão de Constituição e Justiça. Um caso especial: os militares e a Cúria militar em especial estão incomodados com o artigo 9º. - sobre o serviço religioso destinado, igualmente, a todas as denominações religiosas (cf. artigo 9º).
 
Projetos propostos pela Deputada Luiza Erundina
            A CNBB recebeu a visita da Deputada Luiza Erundina, explicitando preocupações do Legislativo e oferecendo sugestões para o trabalho eclesial.
Insistia, sobretudo, na importância de três Projetos de Lei:
a)      Um Projeto de Lei complementar (n. 93/97), de sua autoria, que estabelece a criação de Segmento Nacional de Finanças Populares e Solidárias, constituído pelo Conselho Nacional de Finanças Populares e Solidárias – CONAFIS e pelos Bancos Populares de Desenvolvimento Solidário – BPDS;
b)      Projeto de Lei Complementar, (n. 264/2007), que define objetivos e metas de responsabilidade social. Altera a Lei de Responsabilidade Fiscal para incluir dispositivos que tratam de responsabilidade social;
c)      Um Projeto de Lei (n. 174/2009) - Sugestão da Frente Parlamentar pela Reforma Política, com participação popular. Tem como objetivo regulamentar o artigo 14 da Constituição Federal, em matéria de plebiscito, referendo e iniciativa popular e alterar a legislação que dispõe sobre financiamento dos partidos políticos, sobre voto em listas partidárias pré-ordenadas, sobre coligações eleitorais, sobre a instituição de federações partidárias e sobre a fidelidade partidária.
 
Dedução de impostos de renda de quantias doadas às instituições religiosas
            Tramita na Câmara dos Deputados, na Comissão de Finanças e Tributação, o Projeto de Lei 3543/2008, de autoria do deputado evangélico Eduardo Cunha que estabelece a dedução de impostos de renda de quantias doadas às instituições religiosas, ou seja, o fiel poderá deduzir de imposto de renda os dízimos e ofertas entregues às igrejas. Apesar do aparente benefício ao dizimista, a aprovação dessa proposta, sob o ponto de vista eclesial cria algumas dificuldades do ponto de vista operacional e normativo. Além de tolher a dimensão da mística da gratuidade da oferenda, caso o PL se transforme em lei, as igrejas, as missões e as instituições cristãs deverão inclusive emitir recibos e comprovantes de recebimento de ofertas e dízimos a pedido dos fiéis. Acreditamos que a relação entre igrejas e fiéis terá uma conotação mais comercial que espiritual.
 
Estatuto da Igualdade racial
Finalmente, foi votado no Senado o Estatuto de Igualdade Racial. Está agora aguardando ser sancionado pelo Presidente da República. Esteve presente à sessão de aprovação o bispo referência para a Pastoral Afro-Brasileira – Dom João Alves dos Santos, bispo de Paranaguá-PR.
 
 
Contribuíram para esta análise:
Pe. Antonio Abreu SJ, Pe. Bernard Lestiene SJ, Pe. Thierry Linard SJ (Ibrades),
Daniel Seidel, Ir. Delci Franzen, Pe. José Ernanne Pinheiro, Paulo Maldos, Éden Magalhães
 
Profº Msc Daniel Seidel
Universidade Católica de Brasília e CBJP/CNBB


[1]           Cysne, Rubens Penha - Passivo Externo Líquido Versus Dívida Externa Líquida, maio 2008, professor de EPGE/FGV: “Recentemente, anunciou-se que o Brasil passou de devedor a credor internacional. Isto significa que sua Dívida Externa Líquida (DEL), da forma como calculada pelo Banco Central, passou de positiva a negativa. Por outro lado, o Passivo Externo Líquido (PEL) brasileiro medido a partir dos dados da Posição Internacional de Investimentos (PII), também calculado e reportado pelo Banco Central, tem subido continuamente, tendo passado de U$ 230 bilhões em 2002 a U$ 543 bilhões ao final de 2007.
[2]              Esse fabuloso ganho foi decorrente da desvalorização cambial de 36% e da taxa de juros praticada de 10% em média (1,36 x 1,1 = 1,5).

[3]              Diversos outros indícios de ilegalidades no endividamento foram apontados pelo Voto em Separado, que foi entregue ao Ministério Público e se encontra disponível na página (www.divida-auditoriacidada.org.br). Nesta página também, o movimento pela Auditoria Cidadã da Dívida, disponibilizou a cobertura completa da CPI, com 29 Boletins periódicos, resumindo todas as sessões da Comissão 

https://www.alainet.org/en/node/142515
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