Armas e sexo que terão videoteipes

19/02/2018
  • Español
  • English
  • Français
  • Deutsch
  • Português
  • Opinión
militares.jpg
Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil
-A +A

Numa entrevista no programa da BBC, “Midweek”, concedida em 2 de julho de de 1975, “Sir” Raymund Smith, comerciante de armas, com aquela fleuma colonial inglesa cuja lógica dispensa premissas -porque certos ingleses não precisam de premissas para impor suas conclusões- disse, sem nenhuma cerimônia: “Nós reconhecemos as armas não como um meio de iniciar uma guerra, mas como um meio de parar uma guerra”. É possível “reconhecer” isso. Assim como é possível, para debelar os incêndios florestais, “queimar” uma parte da mata, para o qual os ventos levam o fogo em andamento, para que ele possa ser bloqueado, por não encontrar, adiante, o que queimar.

 

O que esta inversão de objetivos não responde, porém, é porque não foram bloqueadas as armas que iniciaram a guerra, que seria presumivelmente sustada pelas armas do vendedor de armas e “Sir” inglês. Não considera, igualmente, esta inversão, como seria neutralizado quem ateou o fogo, que necessitou um novo fogo para ser debelado? D.H. Lawrence num ensaio escrito em 1928 diz o seguinte, sobre o nexo entre causas e efeitos para a compreensão do sexo: “A ciência diz que o sexo é um instinto, mas o que é um instinto?” E prossegue: “Aparentemente o instinto é um hábito muito antigo que se enraizou. Mas um hábito, mesmo de longa data, tem de ter começado de algumas forma. E, na realidade, não existe um começo para o sexo”. Logo ele não é hábito, nem instinto, mas, se não se considerasse a premissa de Lawrence, ele poderia ser aceito como tal.

 

Como se vê, classificar o sexo como “instinto”, para Lawrence, seria uma forma de “fixar” o sexo na sua fisiologia ou naturalidade. Ou ainda seria tão tosco como usar armas para sustar uma guerra, já em andamento. Seria, também, como usar o fogo -não para bloquear o fogo e restaurar as possibilidades de vida- mas usá-lo para alimentar a combustão em curso, sem perspectivas de extingui-la de forma consciente. Na lógica formal, é o jogo das premissas que determina a conclusão, que pode ser qualquer uma, dependendo dos encadeamentos que são dados a elas.

 

A decisão do Presidente Temer, de fazer a intervenção na Segurança Pública do Rio, porém, sequer teve premissas. Como o Presidente não tem mais o que perder, em termos de prestígio político e respeito efetivo do povo brasileiro, ele apelou diretamente para um conceito. Não para um raciocínio que fosse minimamente lógico. Na decisão do Presidente está contido um conceito de “segurança nacional”, que envolve – como é sabido – a noção de “inimigo interno”, que não corresponde ao que são os 99% de cidadãos e cidadãs, honestos e trabalhadores, que apenas moram nas comunidades dos morros do Rio.

 

Como é sabido, os trabalhadores e suas famílias que residem ali, são apenas vizinhos das quadrilhas de traficantes que operam naquele circuito. E o trágico é que o Presidente Temer, envolvendo -no centro da sua decisão política desastrada- uma instituição do Estado, que estava com uma postura ponderada no curso da crise, joga agora todas as Forças Armadas no olho do furacão. À criminalização da política, feita meticulosamente pelo oligopólio da mídia, já sucederá a politização da criminalidade.

 

Ao colocar as Forças Armadas na aventura intervencionista, contra recomendação do Comandante do Exército, o Presidente aguça a crise da segurança no Rio e abala o prestígio das nossas Forças Armadas, aqui e no exterior, já que a população ficará -nas zonas mais densas da criminalidade- no fogo cruzado que certamente vai proliferar naquelas regiões. O “inimigo interno”, que, no caso, são os bandidos armados vão, ao mesmo tempo que coagir as famílias que ali residem, também dissimular-se na população que ´ficará no fogo cruzado. As premissas escondidas de Temer estão contidas no seu isolamento de Governo ilegítimo, que sequer tem coragem de mostrar sua face.

 

- Tarso Genro foi Governador do Estado do Rio Grande do Sul, prefeito de Porto Alegre, Ministro da Justiça, Ministro da Educação e Ministro das Relações Institucionais do Brasil.

 

Fevereiro 19, 2018

https://www.sul21.com.br/colunas/tarso-genro/2018/02/armas-e-sexo-que-terao-videoteipes/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/191121
Subscrever America Latina en Movimiento - RSS