Dia da Consciência Negra

Seis estatísticas que mostram o abismo racial no Brasil

No Brasil, a população negra é mais atingida pela violência, desemprego e falta de representatividade.

20/11/2017
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Marcha da Consciência Negra, em 2016
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
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A população negra é a mais afetada pela desigualdade e pela violência no Brasil. É o que alerta a Organização das Nações Unidas (ONU). No mercado de trabalho, pretos e pardos enfrentam mais dificuldades na progressão da carreira, na igualdade salarial e são mais vulneráveis ao assédio moral, afirma o Ministério Público do Trabalho.

 

De acordo com o Atlas da Violência 2017, a população negra também corresponde a maioria (78,9%) dos 10% dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios.

 

Ao ser confrontado com as estatísticas, o racismo brasileiro, sustentado em três séculos de escravidão e muitas vezes minimizados pela branquitude nativa, revela-se sem meias palavras.

 

"Esse é um país que convive com uma desigualdade estrutural, especialmente em relação à questão racial", afirma Kátia Maia, diretora executiva da Oxfam, em entrevista à CartaCapital. 

 

Oded Grajew, presidente do conselho deliberativo da organização, diz que o preconceito social no País passa também pelo racismo. "Só não concorda quem não acompanha o dia a dia da vida brasileira. Um negro que dirige um carro médio, por exemplo, é parado diversas vezes pela polícia, ou quando vai a um restaurante, avisam a ele que a entrada de serviço é do outro lado. Para curar qualquer doença, é preciso reconhecer a doença", afirma.

 

Segundo o IBGE, mais da metade da população brasileira (54%) é de pretos ou pardos, sendo que a cada dez pessoas, três são mulheres negras.

 

Igualdade salarial só em 2089

 

Apenas em 2089, daqui a pelo menos 72 anos, brancos e negros terão uma renda equivalente no Brasil. A projeção é da pesquisa "A distância que nos une - Um retrato das Desigualdades Brasileiras" da ONG britânica Oxfam, dedicada a combater a pobreza e promover a justiça social.

 

Em média, os brasileiros brancos ganhavam, em 2015, o dobro do que os negros: R$1589, ante R$898 mensais.

 

"Só alcançaremos uma equiparação salarial entre negros e brancos em 2089, 200 anos depois da abolição da escravidão no Brasil. Isso se a desigualdade continuar diminuindo no ritmo que está", alerta a diretora-executiva da Oxfam. 

 

A conta é feita com base em dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), considerando rendimentos como salários, benefícios sociais, aposentadoria, aluguel de imóveis e aplicações financeiras, entre outros.

 

Ainda segundo o relatório, 67% dos negros no Brasil estão incluídos na parcela dos que recebem até 1,5 salário mínimo (cerca de R$1400). Entre os brancos, o índice fica em 45%.

 

Feminicídio de mulheres negras aumentou, das brancas caiu

 

O feminicídio, isto é, o assassinato de mulheres por sua condição de gênero, também tem cor no Brasil: atinge principalmente as mulheres negras. Entre 2003 e 2013, o número de mulheres negras assassinadas cresceu 54%, ao passo que o índice de feminicídios de brancas caiu 10% no mesmo período de tempo. Os dados são do Mapa da Violência 2015, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Estudos Sociais. Uma evidência de que os avanços nas políticas de enfrentamento à violência de gênero não podem fechar os olhos para o componente racial.

 

As mulheres negras também são mais vitimadas pela violência doméstica: 58,68%, de acordo com informações do Ligue 180 - Central de Atendimento à Mulher, de 2015.

 

Elas também são mais atingidas pela violência obstétrica (65,4%) e pela mortalidade materna (53,6%), de acordo com dados do Ministério da Saúde e da Fiocruz.

 

Jovens e negros: as maiores vítimas da violência

 

Homens, jovens, negros e de baixa escolaridade são as principais vítimas de mortes violentas no País. A população negra corresponde a maioria (78,9%) dos 10% dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios, de acordo com informações do Atlas da Violência 2017, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

 

Atualmente, de cada 100 pessoas assassinadas no Brasil, 71 são negras. De acordo com informações do Atlas, os negros possuem chances 23,5% maiores de serem assassinados em relação a brasileiros de outras raças, já descontado o efeito da idade, escolaridade, do sexo, estado civil e bairro de residência.

 

“Jovens e negros do sexo masculino continuam sendo assassinados todos os anos como se vivessem em situação de guerra”, compara o estudo.

 

Maioria dos presos

 

O Brasil abriga a quarta maior população prisional do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, da China e da Rússia. Tratam-se de 622 mil brasileiros privados de liberdade, mais de 300 presos para cada 100 mil habitantes. Mais da metade (61,6%) são pretos e pardos, revela o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen).

 

Na contramão dos demais países, porém, a taxa de aprisionamento no Brasil não está diminuindo. Entre 2004 e 2014, o índice cresceu 67%. A taxa de superlotação por aqui também é maior: 147% no Brasil, ante 102% nos Estados Unidos e 82% na Rússia.

 

Baixa representatividade no cinema e na literatura

 

Só 10% dos livros brasileiros publicados entre 1965 e 2014 foram escritos por autores negros, afirma pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) que também analisou os personagens retratados pela literatura nacional: 60% dos protagonistas são homens e 80% deles, brancos.

 

Já a pesquisa "A Cara do Cinema Nacional", da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, revelou que homens negros são só 2% dos diretores de filmes nacionais. Atrás das câmeras, não foi registrada nenhuma mulher negra. O fosso racial permanece entre os roteiristas: só 4% são negros.

 

O levantamento da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) considerou as produções brasileiras que alcançaram as maiores bilheterias entre 2002 e 2014. Dentre os filmes analisados, 31% tinham no elenco atores negros, quase sempre interpretando papeis associados à pobreza e criminalidade.

 

Crise e desemprego

 

A crise e a onda de desemprego também atingiu com mais força a população negra brasileira: eles são 63,7% dos desocupados, o que corresponde a 8,3 milhões de pessoas. Com isso, a taxa de desocupação de pretos e pardos ficou em 14,6% - entre os trabalhadores brancos, o índice é menor: 9,9%.

 

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgada nesta sexta-feira 17 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, no terceiro trimestre de 2017 o rendimento médio de trabalhadores negros foi inferior ao dos brancos: 1,5 mil ante 2,7 mil reais.

 

*Colaborou Rodrigo Martins e Miguel Martins

 

20/11/2017

https://www.cartacapital.com.br/sociedade/seis-estatisticas-que-mostram-o-abismo-racial-no-brasil

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/189333
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