Declaração conjunta dos prefeitos e do Papa

05/02/2016
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Papa Francisco (Foto: Tiberio Barchielli / Palazzo Chigi) papa francisco
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A Declaração conjunta do Encontro de cerca de cem prefeitos das maiores cidades do mundo com o Papa Francisco - realizado no Vaticano nos dias 21 e 22 de julho de 2015 - começa dizendo: “Nós, abaixo-assinados, nos reunimos aqui, na Academia Pontifícia das Ciências e na Academia Pontifícia das Ciências Sociais, com o objetivo de abordar duas dramáticas emergências correlacionadas: as mudanças climáticas induzidas pelo ser humano e a exclusão social nas formas extremas de radical pobreza, da escravidão moderna e do tráfico de pessoas”.

 

E ainda: “Chegamos até aqui de diversos âmbitos e diferentes culturas e, assim, somos o fiel reflexo do desejo, compartilhado por toda a humanidade, de paz, felicidade, prosperidade, justiça e sustentabilidade ambiental. Seguindo o que afirma a encíclica ‘Laudato si', consideramos a esmagadora evidência científica que confirma a existência de uma mudança climática provocada pelo ser humano, assim como a perda de biodiversidade e a vulnerabilidade dos mais pobres aos desastres econômicos, sociais e ambientais”.

 

Diante das urgências representadas “pelas mudanças climáticas antropogênicas, a exclusão social e a pobreza extrema”, os prefeitos - como fruto de consenso - fazem as seguintes declarações.

 

Em primeiro lugar, eles reconhecem a realidade. “As mudanças climáticas antropogênicas são uma realidade cientificamente comprovada, e o seu controle efetivo é um imperativo moral que atinge toda a humanidade. Neste fundamental espaço moral, as cidades de todo o planeta cumprem um papel-chave. Todas as nossas tradições culturais afirmam a inerente dignidade e a responsabilidade social de cada indivíduo em sua relação com o bem comum de toda a humanidade. Elas proclamam a beleza e a maravilha do mundo natural, assim como a sua inerente bondade, e a valorizam como um dom precioso que foi confiado ao nosso cuidado comum; por isso, é nosso dever moral respeitar, e nunca devastar, este jardim que é a nossa ‘casa comum’. Os pobres e os excluídos, embora participem minimamente na disrupção do clima, estão expostos a temíveis ameaças por causa de perturbações climáticas antropogênicas, tais como a maior frequência de secas, tempestades extremas, ondas de calor e o aumento incessante do nível do mar”.

 

Em segundo lugar, os prefeitos sabem que o ser humano tem hoje a possibilidade de mudar a realidade. “Hoje, a humanidade conta com os instrumentos tecnológicos, os meios financeiros e o conhecimento adequado para reverter as mudanças climáticas antrópicas, pondo fim, ao mesmo tempo, à pobreza extrema, mediante a aplicação de soluções relativas ao desenvolvimento sustentável, tais como a adoção de sistemas de baixo carbono, com o respaldo das tecnologias da informação e da comunicação. O financiamento das iniciativas em prol do desenvolvimento sustentável, tais como as destinadas a manter um efetivo controle das mudanças climáticas antropogênicas, deve ser impulsionado por incentivos que ajudem na transição para energias de baixo carbono e renováveis, e deve incorporar a busca incansável da paz, o que permitirá que os orçamentos dos governos passem a priorizar os investimentos na sustentabilidade, que tanto fazem falta, em detrimento dos gastos bélicos. O mundo deve saber que a cúpula sobre as mudanças climáticas (COP 21, realizada em Paris no fim de 2015) pode ser a última oportunidade efetiva de negociar acordos para manter o aquecimento antropogênico abaixo dos 2ºC e para apontar, para uma maior segurança, a que se mantenha o clima do planeta bem abaixo desse limiar. No entanto, se continuar a trajetória atual, a humanidade poderia facilmente alcançar a devastadora cifra de 4ºC ou mais”.

 

Em terceiro lugar, os prefeitos lembram a responsabilidade dos políticos. “Os líderes políticos de todos os Estados-membros da ONU têm a especial responsabilidade de concordar, no marco da COP 21, um ousado acordo em prol do clima que limite o aquecimento do planeta a um nível seguro para a humanidade e que proteja os mais pobres e vulneráveis das mudanças climáticas ininterruptas que colocam as suas vidas em grave perigo. Tal como prometeram, os países com altos níveis de renda devem ajudar a financiar os custos da mitigação das mudanças climáticas nas nações mais necessitadas”.

 

A Declaração nos convida a uma profunda reflexão!

 

Segunda parte

 

Como vimos na 1ª parte da Declaração, os prefeitos, em primeiro lugar, reconhecem a realidade da escravidão moderna e das mudanças climáticas; em segundo lugar, sabem que o ser humano tem hoje a possibilidade de mudar essa realidade; e, em terceiro lugar lembram a responsabilidade dos políticos a esse respeito. Dando continuidade, apresento neste artigo a 2ª parte da Declaração.

 

Em quarto lugar, os prefeitos dizem o que precisa ser feito com urgência. “Para reverter as mudanças climáticas antrópicas, será necessária uma rápida transformação que faça do nosso habitat um mundo impulsionado por energias de baixo carbono - entre elas as renováveis - e fundado na gestão sustentável dos ecossistemas. Tais transformações deverão ser realizadas no marco dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que, concordados em nível mundial, terão como objetivo pôr fim à pobreza extrema, garantir o acesso universal à saúde, à educação de qualidade, à água potável e à energia sustentável; e fomentar a cooperação para erradicar o tráfico de pessoas e todas as formas modernas de escravidão”.

 

Em quinto lugar, os prefeitos tornam públicos os compromissos que pretendem assumir. “Como prefeitos, comprometemo-nos a reforçar em nossas cidades e assentamentos urbanos a capacidade de persistência dos pobres e daqueles que estão em situação de vulnerabilidade, e reduzir a sua exposição aos eventos extremos relacionados com o clima e outros impactos e catástrofes econômicas, sociais e ambientais, que fomentam o tráfico de pessoas e os riscos da migração forçada. Comprometemo-nos, outrossim, a acabar com o abuso, a exploração, o tráfico de pessoas e todas as formas de escravidão moderna, que são crimes de lesa humanidade, incluindo o trabalho forçado e a prostituição, o tráfico de órgãos e a escravidão doméstica. Comprometemo-nos também a desenvolver programas nacionais de reassentamento e reintegração que evitem a repatriação involuntária das pessoas vítimas de tráfico (cf. a revisão dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, n. 16.2, realizada pela PASS).

 

Em sexto e último lugar, os prefeitos exprimem um desejo. “Queremos que as nossas cidades e assentamentos urbanos sejam cada vez mais socialmente inclusivos, seguros, persistentes e sustentáveis (cf. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, n. 11). Todos os setores e todas as partes interessadas deverão desempenhar o papel que lhes corresponde: esse é um compromisso a que cada um de nós se soma plenamente, seja como prefeitos, seja como pessoas”.

 

Companheiros e companheiras de caminhada, irmãos e irmãs, que Declaração bonita! Que maravilha de compromissos! Ah, se todos os prefeitos (e todos os governantes e políticos) levassem a sério essa Declaração e a colocassem em prática! Cabe aos Movimentos Populares, às Pastorais Sociais e Ambientais e a todos/as nós, que queremos um outro mundo possível, cobrar isso deles. É um grande sinal de esperança! Vamos à luta!

 

As assinaturas originais dos prefeitos do mundo inteiro (incluindo os prefeitos brasileiros de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Curitiba, Porto Alegre e Goiânia), presentes no Encontro, podem ser conferidas no texto da Declaração disponibilizada pela Santa Sé, em: http://www.pass.va/content/dam/scienzesociali/booklet/declaration21july2015.pdf.

 

O Papa Francisco subscreveu a Declaração e, junto com sua assinatura, deixou - como um irmão confiante - a seguinte mensagem: "Agradeço esta Declaração. Desejo que faça muito bem".

 

- Frei Marcos Sassatelli é frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP), professor aposentado de Filosofia da Universidade Federal de Goiás (UFG).

 

04/02/2016

http://www.brasildefato.com.br/node/34071

https://www.alainet.org/pt/articulo/175271

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