Gênero e mudança social em El Salvador

02/03/2012
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Apesar das declarações e compromissos da comunidade internacional acerca da igualdade de gênero, as condições da mulher no mundo continuam sendo trágicas, mesmo quando se registrem certos avanços em alguns estados e em determinadas sociedades.

Essas condições se replicam, com suas especificidades, em todo o mundo em desenvolvimento. Em El Salvador, que é o menor país da América Latina, vulnerável, e onde estão mais dramaticamente acentuadas as desigualdades, a discriminação, iniquidade e violência de que padecem as mulheres são tão evidentes como indignantes.

Os dados estatísticos, na realidade, são uma fria manifestação dessas deploráveis tragédias. A sociedade salvadorenha está integrada por quase 53% de mulheres. Até faz apenas três anos, a sociedade salvadorenha ainda vivia sob governos inclinados a proteger o privilégio de um pequeno grupo social e a desamparar as grandes maiorias. Estes governos que, sob a ideia de uma igualdade formal, escondiam por trás das normas e das políticas as evidentes discriminações, iniquidades e violência que, por razão de gênero e desde uma base e consideração estrutural e histórica, têm bloqueado a qualidade de vida e o desenvolvimento da sociedade e das mulheres em particular.

Meus anos de residência e trabalho político, social e cultural em El Salvador me deram um conhecimento profundo dessa realidade, que me indignava. Durante a campanha eleitoral do presidente Mauricio Funes, concebi a ideia de criar um centro destinado à atenção integral da problemática das mulheres, e para as mulheres, que não tivesse nenhuma relação com as velhas e fracassadas políticas ensaiadas durante anos na América Latina.

Surgiu, então, “Ciudad Mujer” (www.inclusionsocial.gob.sv). A ideia da criação de “Ciudad Mujer” esteve baseada em três fatores, que são: o reconhecimento das iniquidades de gênero como parte inaceitável da realidade; a existência de normativa nacional e internacional, que gera a obrigação de dar passos progressivos para a promoção e realização dos direitos das mulheres, incluindo a eliminação de toda forma de violência e de discriminação, por questão de gênero; e, finalmente, a visão estratégica de país e de sociedade que pretende alcançar o atual governo de El Salvador.

Desde una perspectiva conceitual, “Ciudad Mujer” é um centro de serviços baseado em um enfoque de direitos que supera a visão do assistencialismo e da caridade, geralmente muito próprios da maneira tradicional de realizar ação social na América Latina. As necessidades de atenção que as mulheres apresentam estão entendidas como privações, carências, vazios ou exclusões que, por questão de gênero, as mulheres enfrentam na realização e gozo de seus direitos.

Trata-se de uma aposta inovadora, que começou a dar frutos além dos esperados, apesar da sua breve existência. Inúmeras mulheres vêm recebendo atenção na primeira sede de “Ciudad Mujer” e este ano começaremos a construção de outras sedes, com o apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que tem tomado o projeto como modelo para toda a América Latina.

Por esse impacto, e por seu potencial, “Ciudad Mujer” foi reconhecida em nível internacional com o Prêmio à Iniciativa em Saúde e “Empoderamento” que oferece South South News Initiative (Nações Unidas), e com o Prêmio Américas 2011, pela promoção da igualdade de gênero e a autonomia da mulher (Nações Unidas, Organização dos Estados Americanos, Centro Carter). A experiência se afirma e começa a estender-se a outros países americanos.

Com este instrumento, as mulheres tradicionalmente excluídas ao longo da história, começaram a se tornar visíveis nas políticas públicas. Ao serem reconhecidas pelo Estado, reconhecem-se a si mesmas como titulares de direitos e como cidadãs. Essa é a potência transformadora de “Ciudad Mujer”. Será o grande legado do Presidente Mauricio Funes à luta autêntica, de ações, e não de palavras, pela igualdade de gênero.
 
- Vanda Pignato é Primeira Dama e Secretária de Inclusão Social da República de El Salvador.
 
 
https://www.alainet.org/pt/articulo/156261

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