Capital social

03/09/2001
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A Campanha contra a Fome, liderada pelo saudoso Betinho, contribuiu de forma decisiva para mostrar como a crescente organização da sociedade civil passou a enfrentar o desafio do resgate de uma dívida social secular e perversa. Isto fica claro quando se vê o tamanho e a importância do Terceiro Setor, incluindo não só os milhares de voluntários anônimos que doam parte de seu tempo às mais variadas causas e iniciativas, mas, igualmente, sindicatos, movimentos comunitários, organizações não- governamentais e outros grupos. Eles desenvolvem atividades altamente diversificadas, que vão desde a assistência a menores carentes ao apoio a minorias, da denúncia de más condições de trabalho à defesa do meio ambiente, da coleta de alimentos à organização de eventos, da criação de creches a formas inéditas de educação, da defesa do consumidor a lutas pela universalização dos mais elementares direitos humanos. Muitas empresas, nacionais ou multinacionais, por exemplo, estão engajadas na promoção do "empowerment" de associações e entidades voltadas à educação de menores, jovens e adolescentes, revolucionando o sistema de ensino num setor que apresenta as maiores deficiências do próprio Estado. Porém, o fator mais decisivo de mudança, responsável por um novo tecido social no qual todos nós aprendemos a nos agrupar em torno de objetivos sociais, éticos e culturais, é a crescente descoberta, pela iniciativa privada, da responsabilidade social corporativa na gestão empresarial. E, por conseqüência, a descoberta da importância do estabelecimento de parcerias para atuar em favor dos desassistidos, dos abandonados, dos carentes, dos excluídos - numa palavra, dos marginalizados. Antes, as práticas sociais eram atividades bastante secundárias ou paralelas, no âmbito das empresas. Hoje, contudo, são cada vez mais prioritárias, na medida em que executivos, diretores e acionistas tomaram consciência da importância de sua atuação social, tanto para a aceitação de seus produtos e serviços pelo mercado quanto para o fortalecimento da imagem corporativa da empresa perante a própria sociedade. A "empresa cidadã" é aquela cujos objetivos não se restringem à maximização do lucro, sem outras considerações de natureza social e ética. Ela sabe que os agentes econômicos jamais atuam no vazio e que, ao buscar o máximo possível de retorno sobre o capital, também têm de levar em consideração as dimensões sociais, ambientais e morais de sua atividade. Por isso, hoje já não hesitam em criar as condições propícias a uma organização mais social e pluralista da economia e da sociedade como um todo. Seja pelo desejo de realização pessoal ou por motivação religiosa de seus executivos, acionistas e controladores, seja pela convicção de que uma economia aberta e competitiva não precisa ser injusta para funcionar bem, a partir do momento em que a iniciativa privada ocupou seu espaço no Terceiro Setor, o voluntariado deixou de ter um caráter de esmola e de ser sinônimo de pieguice, para ter uma conotação positiva. Capital social. Esta talvez seja a expressão que melhor sintetiza a combinação virtuosa expressa pela soma do potencial de mobilização, organização, conhecimento e logística das empresas privadas e o valor das horas cedidas por dezenas de milhares de voluntários, multiplicando, em progressão geométrica, o alcance da atuação das entidades do Terceiro Setor. É por isso que destaco a importância de se disseminar e aprofundar os conceitos de "cidadania corporativa" e de "responsabilidade social empresarial", para melhor adaptá-las às condições sociais, econômicas, políticas e culturais deste Brasil tão heterogêneo e injusto, a fim de que iniciativas generosas, em seus propósitos, não se esgotem em si mesmas, deixando de ser episódicas para se tornarem permanentes. O Brasil mais justo e equitativo, mais democrático e próspero, mais dinâmico e influente com que tanto sonhamos está muito mais próximo do que imaginamos. * Milú Villela é presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Presidente do Comitê do Ano Internacional do Voluntário e do Centro de Voluntariado de São Paulo.
https://www.alainet.org/pt/articulo/105306
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