Lula e os controladores
02/04/2007
- Opinión
A fala do presidente Lula ontem no programa oficial do governo, A Voz do Brasil, foi qualquer coisa de surreal. Interrogado sobre a greve dos controladores de vôo, ele deixou muito clara a sua opinião sobre a luta de qualquer trabalhador. “Eles podem fazer o que quiserem, mas não podem prejudicar a população”. Ora essa, então como é que se faz greve, senhor sindicalista revolucionário? Como é que ele mesmo fazia quando era presidente do sindicato dos metalúrgicos nos gloriosos anos do final dos 70? Greve é o quê, afinal? Espaço da negociação do consenso, sem conflitos aparentes, bem ao gosto de Habermas? Não! Greve é luta renhida e sofrem os dois lados: os que a fazem e os que a sofrem.
Além disso, ao desancar os trabalhadores do controle de vôo o presidente desqualificou sua própria negociação, pois, afinal, não foi o seu governo que sentou com os trabalhadores e chegou a um acordo? Que coisa louca é essa? A fala presidencial é um desvario. Mais um, deste homem que, abandonando as trincheiras da esquerda, fez uma opção de classe: assumiu a pele da elite dominante. O que causa pena é que a elite não o reconhece, e, certamente, tão logo desça de sua cadeira presidencial, será apartado do rebanho dos poderosos. Já terá servido o suficiente.
Os controladores de vôo esperaram tempo demais para suspender o serviço. Conversaram, pediram, rogaram, negociaram, clamaram e fizeram acordos. Essa novela durou meses, sem resolução. Até que, último recurso, pararam. Então foi o caos. Nos aeroportos, espaço de circulação da elite e da classe média que compra passagens à crédito, as pessoas se acumulavam e – pasmem – xingavam os funcionários das companhias. No bom e velho estilo do “sabe com quem estás falando?” deram o seu show. Na televisão, os repórteres só mostravam isso. A revolta dos passageiros. Dos controladores e suas dores, muito pouco se disse.
As cenas na TV eram tragicômicas. Uma mulher, ricamente vestida, aos berros, clamava: “eu quero comer, eu quero dormir, quero tomar água. Tenho esse direito”. E estava apenas há algumas horas esperando. Agora pensem nos garotos de rua das metrópoles, nas meninas prostituídas nos cantões do país, nas famílias desempregadas, prescindidas pelo capital, esperando há uma vida. Quem as escuta? Aí o grito daquela mulher ficou patético. Pouco mais de 2% da população brasileira, de um total de 180 milhões, usa o avião como transporte. Então porque todo esse alvoroço?
O certo é que o governo, premido pelo grito das elites voadoras, sentou e negociou mais um acordo com os controladores de vôo. Mas, logo em seguida, o presidente os chama de irresponsáveis. Que loucura é essa? Ninguém quer saber. Afinal, os aviões voltaram a circular e as gentes bem vestidas puderam voar. Já os anônimos controladores de vôo, esses homens que estão doentes e tristes, que são explorados, voltaram aos seus postos, organizando a vida de quem sequer se importa com eles. Tudo o que os que voam querem é que a máquina despegue. O ser destroçado que a guia, pouco importa. Não perceberão esses viajantes que sem o guia podem se espatifar no chão? Não! Tampouco vão querer saber dos mais de 10 mil desempregados gerados pela fusão da Varig com a Gol. Porque na mídia só aparecem as coisas boas... E os viajantes do ar só querem uma coisa: decolar!
- Elaine Tavares – jornalista no Ola/UFSC. O OLA é um projeto de observação e análise das lutas populares na América Latina. http://www.ola.cse.ufsc.br
Além disso, ao desancar os trabalhadores do controle de vôo o presidente desqualificou sua própria negociação, pois, afinal, não foi o seu governo que sentou com os trabalhadores e chegou a um acordo? Que coisa louca é essa? A fala presidencial é um desvario. Mais um, deste homem que, abandonando as trincheiras da esquerda, fez uma opção de classe: assumiu a pele da elite dominante. O que causa pena é que a elite não o reconhece, e, certamente, tão logo desça de sua cadeira presidencial, será apartado do rebanho dos poderosos. Já terá servido o suficiente.
Os controladores de vôo esperaram tempo demais para suspender o serviço. Conversaram, pediram, rogaram, negociaram, clamaram e fizeram acordos. Essa novela durou meses, sem resolução. Até que, último recurso, pararam. Então foi o caos. Nos aeroportos, espaço de circulação da elite e da classe média que compra passagens à crédito, as pessoas se acumulavam e – pasmem – xingavam os funcionários das companhias. No bom e velho estilo do “sabe com quem estás falando?” deram o seu show. Na televisão, os repórteres só mostravam isso. A revolta dos passageiros. Dos controladores e suas dores, muito pouco se disse.
As cenas na TV eram tragicômicas. Uma mulher, ricamente vestida, aos berros, clamava: “eu quero comer, eu quero dormir, quero tomar água. Tenho esse direito”. E estava apenas há algumas horas esperando. Agora pensem nos garotos de rua das metrópoles, nas meninas prostituídas nos cantões do país, nas famílias desempregadas, prescindidas pelo capital, esperando há uma vida. Quem as escuta? Aí o grito daquela mulher ficou patético. Pouco mais de 2% da população brasileira, de um total de 180 milhões, usa o avião como transporte. Então porque todo esse alvoroço?
O certo é que o governo, premido pelo grito das elites voadoras, sentou e negociou mais um acordo com os controladores de vôo. Mas, logo em seguida, o presidente os chama de irresponsáveis. Que loucura é essa? Ninguém quer saber. Afinal, os aviões voltaram a circular e as gentes bem vestidas puderam voar. Já os anônimos controladores de vôo, esses homens que estão doentes e tristes, que são explorados, voltaram aos seus postos, organizando a vida de quem sequer se importa com eles. Tudo o que os que voam querem é que a máquina despegue. O ser destroçado que a guia, pouco importa. Não perceberão esses viajantes que sem o guia podem se espatifar no chão? Não! Tampouco vão querer saber dos mais de 10 mil desempregados gerados pela fusão da Varig com a Gol. Porque na mídia só aparecem as coisas boas... E os viajantes do ar só querem uma coisa: decolar!
- Elaine Tavares – jornalista no Ola/UFSC. O OLA é um projeto de observação e análise das lutas populares na América Latina. http://www.ola.cse.ufsc.br
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