Os desafios dos movimentos sociais latinoamericanos

11/12/2006
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Nosso continente esta vivendo um novo período, na sua trajetória histórica da luta de classes e de enfrentamento com o império. Há ainda muita complexidade e pouca clareza para compreendermos as características e a natureza desse período que estamos vivendo. Alguns de nós, vêem a revolução ai na esquina. Talvez influenciados pela coragem radical dos discursos de nosso querido Chavez ou pelos avanços reais da mobilização de massa na Bolívia. E que por tanto, o imperialismo já está derrotado e trata-se agora de avançar para o socialismo continental. Outros, tudo ao contrário preferem classificar Chavez e Evo de populistas e que estariam traindo as forças das massas mobilizadas em continente, que querem avançar, mas encontraram barreiras nesses governos. E outros ainda, crêem que o único caminho possível agora na américa latina é o caminho das reformas, do dialogo, da ponderação, para ir acumulando forças e mudanças pela institucional e de forma gradatvia.

A realidade latino-americana e a situação da luta de classes é uma só. Não podemos esconder o que de fato existe. Mas cada quem, à luz de seu olhar ideológico pode dar a interpretação, a descrição que quiser para essa mesma realidade. Isso é a única forma de explicar porque, mesmo entre as forças sociais e políticas de esquerda haja tantas diferenças na analise da realidade atual.

1. -Uma interpretação do período que vivemos.

Temos feito um esforço, modesto e ainda aquém do necessário, na via campesina e no MST para tentarmos entender da melhor forma possivel o que está de fato acontecendo na américa latina. E nesse espaço gostaria de compartilhar com os companheiros e companheiras dos demais movimentos as reflexões coletivas que temos feito.
De fato, nosso continente vive um período histórico novo, diferente de outros momentos. A grosso modo, poderíamos dizer que nosso continente vivenciou vários períodos da historia recente do século XX definidos por características bem limitadas.

O primeiro período poderíamos dizer o que vai da crise do inicio do século até o final da segunda guerra mundial.

Assim, a partir da grande crise enfrentada pelo capitalismo a nível internacional, que resultou nas duas guerras mundiais, inter-imperialistas, por disputas de mercado, um período da luta de classes no nosso continente marcado por:

- Falência dos modelos agro-mineral exportador e implementação de modelos de industrialização dependente, ainda que atrasadas.
- Nascimento de uma burguesia industrial, local, com interesses próprios, porem associados aos interesses da burguesia internacional.
- Hegemonia de governos populistas, que adotaram então regimes políticos reformistas e procuraram acelerar os processo de desenvolvimento econômico, baseados na creença do desenvolvimento nacional, porem dependente do capital estrangeiro.
- Esse modelo trouxe um enorme crescimento econômico para alguns paises, representou o nascimento de uma classe operária, e com ela a ideologia socialista, mas trouxe como conseqüência a urbanização violenta de nossas sociedades, e um modelo altamente concentrador de riqueza e renda.
- Foi nesse período que nasceram também as primeiras bases para uma ideologia socialista com raízes latinas, com as contribuições teóricas e práticas de Jose Martí, Sandino, Mariategui, e as experiências de organizações socialistas e comunistas entre os operários.

Um segundo período pode-se marcar entre a segunda guerra mundial e a revolução nicaragüense.

Nesse período, houve:

- o fracasso do desenvolvimento de um modelo de capitalismo nacional, e da hegemonia das burguesias locais.
- a derrota do nazi-fascismo fortaleceu a esperança do socialismo.
- Surgiram grandes mobilizações de massa em todo conitnente.
- Surgiram muitos movimentos revolucionários (a svezes nem socialistas eram) mas que defendiam o poder para o povo.
- Tivemos um ascenso do movimento de massas e das idéias revolucionarias, que tiveram seu ápice nas revoluções da Bolívia (1952) Guatemala (1956) Cuba (1959) Republica dominicana (1965), Chile (1970) e nas disputas avançadas que houveram em diversos paises como Argentina, Brasil, Peru, e em toda américa latina, que se encerrou com a Vitória dos sandinistas em 1979.

Um terceiro período foi de total hegemonia do capital sobre nosso continente, de derrota da classe trabalhadora e de descenso do movimento de massas.

O capital imperialista fez dois movimentos complementares nesse terceiro período histórico que vem da década de 70 até o final do sécuilo.

- Primeiro para enfrentar a onda revolucionária aplicaram regimes militares na maioria de nossos países.

- Em alguns países do Caribe e da América Central fizeram intervenções militares imperialistas diretamente, com invasões armadas e bases militares, em quase todos eles.

- No meio do processo, a partir do final da década de 80, abandonaram os regimes militares e combinado com uma democracia de fachada, passaram a implementar o modelo neoliberal. O modelo neoliberal para nossas economias, foi a subordinação de nossas economias aos interesses do capital internacional, agora hegemonizado pelo capital financeiro e por grandes corporações transnacionais.

- Esse período foi um longo período de derrota para a classe trabalhadora e para o povo de todo continente, marcadado pelas derrotas da revolução nicaragüense, pela imposição dos acordos de paz, na américa central, e mesmo derrotas eleitorais importantes no Brasil, Peru, que deram hegemonia total ao capital financeiro e internacional.

Quando tudo parecia consolidado, em que Fukuyama, tinha prenunciado o final da historia com a vitória total do capital internacional, eis que o velho Marx tinha razão, e as crises cíclicas de acumulação do capital, agora se manifestaram com mais força e a nível internacional. E as reações populares passaram também a ter um efeito internacional ainda maior. As perversidades sociais desse modelo neoliberal ficaram mais expostas, o povo começou a se dar conta de que seus problemas da pobreza, da desigualdade social, da falta de terra, do desemprego, da falta de moradia e escola, só se agravaram nessas duas décadas de domínio completo.

Então podemos dizer que a partir do novo século, entramos num novo período de nossa historia continental. E se antes, os períodos tinham uma certa variação local, influenciada pela correlação de forças nacionais e o grau de acumulo político da classe trabalhadora em cada país, agora, também temos um componente a mais, a correlação de forças base a ter cada vez mais um caracter também continental, e isso explica, porque as vezes pequenas mudanças num único país, acabam influenciando a correlação de forças no continente.

De 2000 para cá...

As características principais desse novo período, é que :

- começamos com algumas manifestações de resistência popular, mas que tiveram uma simbologia, de rebeldia e de unidade continental muito grande, como foram as a revolta popular em Chiapas (95) as mobilizações em Seatle (99) as revoltas populares no Equador, Bolívia e Argentina, durante os anos de 2000 e 2001, o inicio das realizações dso Fórum Social Mundial, que marcaram um processo de unidade das forças populares frente ao neoliberalismo.
- Tudo isso desencadeou um processo em que o povo de nossos países, as forças populares e sobretudo as forças políticas que hegemonizaram esses processos, priorizaram a luta eleitoral, como campo de disputa e derrota do neoliberalismo. E o povo, como que entendendo que ainda estava em descenso do movimento de massas, e em desvantagen na correlação de forças, aceitou essa saída, de colocar suas energias na via institucional. Praticamente todas as eleições ocorridas no continente a partir de 2002, que tiveram candidatos neo-liberais e candidatos anti-neoliberais, os que se diziam anti-neoliberais ganharam as eleições, ainda que depois muitos deles se revelaram no poder, ainda neoliberais. Felizmente o povo voltou a derrota-los nas ruas, como aconteceu na Argentina, Bolívia e Equador.
- Assim, de nosso período histórico, que tem sua prioridade na via institucional resultou em três tipos de governantes, bem claros. Temos os governos progressistas e de esquerda, representados por Cuba, Venezuela e Bolívia. E que se enfrentam diretamente aos interesses do imperialismo e do capital neoliberal. Depois temos governos progressistas, porem moderados. Representados por Brasil, Argentina, Uruguay, Equador (em processo eleitoral). Esses governos tem uma política ambígua em relação ao imperialismo e ao capital neoliberal. As vezes enfrentam, as vezes comaprtem. E num terceiro bloco temos os governos conservadores, que se somam aos interesses do capital neoliberal e do império no continente, representados pelos governos do Chile, Paraguay e Colômbia. E no norte, capitaneados pelo México, e praticamente todos os governos da América central.

Essa situação e o resultado da atual correlação de forças no continente. Não estamos reascenso do movimento de massas e muito menos das idéias revolucionarias. Estamos num estagio de resistência popular, de acumulo de forças, de disputa, com um inimigo ainda muito poderoso, interna e internacionalmente. Mesmo no caso Boliviano, em que as massas lograram elevado nviel de mobilização que resultou na vitória eleitoral de Evo Morales, com tudo o que ele representa, mas em termos de correlação de forças para mudanças reais na economia e na sociedade, o povo boliviano enfrenta condições adversas pelo elevado nível de poder da classe burguesa, a nível interno e seus apoios internacionais.

2. Desafios para os movimentos sociais.

Sem a pretensão de descrever formulas, e muito menos recomendar lições para outros companheriso e companheiras de outros movimentos, queremos compartilhar nossas preocupações, no sentido de que é necessário compreender a verdadeira natureza da correlação de forças no atual período, para saber dar os passos, de acordo com o tamanho das pernas. E com isso ir acumulando forças, para as mudanças estruturais necessárias, que rompam com o neoliberalismo e com o imperialismo. Mas isso não é apenas um mero ato de boa vontade política. Depende fundamentalmente de acumulo de forças reais, da classe trabalhadora, do povo, para poder implementa-las. Daí que então, nossos movimentos temos ainda inúmeros desafios a serem enfrentados, para colocarmos nossas energias e conseguirmos acumular forças, para um outro período histórico, que esta ainda dependente do reascenso de massas a nível continental. Para que esse reascenso abra as portas de uma nova hegemonia, de um verdadeiro proceso de mudanças sociais.

Assim, descrevo de forma suscinta os principais desafios que temos pela frente, em todas as forças sociais em nossos paises.

a) Retomar o trabalho de base, que eleve o nível de consciência política e ideológica de nossa base social, e crie as condições para as lutas sociais massivas, que possam então desencadear um reascenso do movimento de massas.
b) Dedicar-se quotidianamente e de forma permanente na formação de nossos militantes e quadros. Para que conheçam com profundidade nossa realidade, saibam interpreta-la à luz dos ensinamentos clássicos, para poder transforma-la. É urgente formarmos enormes contingentes de militantes, dessa nova geração juvenil que foi obscurecida pelo neoliberalismo e pelo uso intenso dos meios de comunicação da burguesia.
c) Construir meios de comunicação de massa pro´prios dos movimentos sociais, dos partidos, das forças populares. Precisamos ter não apenas nossos jornais, rádios, mas ter acesso a televisão, e toda forma de comunicação de massa.
d) Debater, aprofundar o conhecimento , articular forças ao redor de um novo projeto de desenvolvimento popular. Ainda estamos longe de um socialismo latino-americano, e não podemos esperar por ele. E ao mesmo tempo precisamos derrotar o imperialismo e o neoliberalismo. Por isso, há um desafio de transição: que modelo econômico precisamos ir construindo que derrote as forças do capital internacional, nesse longo processo de transformação de nossas sociedades?
e) Precisamos ser crativos e diante desse novo período histórico, diante das transformações sócio-economicas que o neoliberalismo e o imperialismo produziram em nossas sociedades, construir novas formas de luta mássicas, que enfrentem o capital. Sabemos que as formas clássicas de greves, paralisações, passeatas, são insuficientes, e por isso precisamos ser criativos. E precisamos desenvolver novos instrumentos de luta, que consigam motivar as pessoas, aglutinar a juventude, dar sentido de esperança nas nossas lutas. E os sindicatos e partidos tradicionais demonstraram que são hoje instrumentos insuficentes para as novas tarefas que a correlação de forças colocou. Que instrumentos são esses, que podem se combinar com sindicatos, movimentos e partidos? Ninguém sabe! Mas são necessários serem criados, organizações político e sociais de novo tipo, adequados a nossa realidade, como no passado outros defenderam em relação ao seu tempo.

Como vêem, estamos trabalhando com reflexões, com desafios, com incertezas. Sem formulas ou modelos pré-determinados. Por isso, precisamos todos, aproveitar todos os espaços coletivos, e de unidade popular, em nossos países e a nível continental, como são as redes de interesse, as cumbres sociais, os FSM, para ampliarmos o debate, refletirmos, pesqusiarmos e encontrarmos coletivamente as verdadeiras saíds que podem nos conduzir para vitórias sobre os interesses do capital local e internacional. Enquanto não encontrarmos as formas de superar os desafios postos, seguiremos ainda por longo tempo, num período de resistência, e de acumulo de forças.

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