Enfrentar os provocadores para que a voz dos trabalhadores do Cazaquistão seja ouvida

Devido à magnitude dos acontecimentos e à intervenção de forças externas, as autoridades do país pediram ajuda aos parceiros. O Conselho de Segurança Coletiva da OTSC decidiu fornecer essa assistência para estabilizar a situação na República do Cazaquistão.

12/01/2022
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As manifestações no Cazaquistão iniciaram no dia 2 de janeiro pelo aumento dos preços do gás.
Foto: Sergei Supinsky / AFP
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Todo movimento amplo contém componentes diferentes. Os eventos no Cazaquistão refletem tanto a agitação social quanto as atividades da “quinta coluna” e as ações de grupos terroristas. Ao mesmo tempo, essa “quinta coluna” inclui extremistas comprometidos com o islamismo radical e inúmeras ONGs alimentadas pelo Ocidente. Também incorpora forças empresariais de segurança, que buscam obter vantagens graças às águas turvas da instabilidade, expressando clãs oligárquicos prontos para usar os protestos em massa na luta pela redistribuição do poder.

 

Os povos irmãos da Rússia e do Cazaquistão estão intimamente relacionados entre si ao longo de séculos de história em comum. Juntos, criamos a União Soviética, construímos, conquistamos e nos orgulhamos de conquistas econômicas e sociais notáveis. Juntos, revivemos os processos de integração, criando a Comunidade Econômica Eurasiática, a OCX (Organização para Cooperação de Xangai) e a OTSC (Organização do Tratado de Segurança Coletiva).

 

Hoje, nossos companheiros e amigos estão passando por momentos difíceis. Os protestos em massa se espalharam por todo o Cazaquistão. Na capital do sul, Almaty, foram produzidos sangrentos distúrbios, com muitas vítimas e destruição.


Uma análise precisa e completa dos eventos deve levar muitos aspectos em consideração. É claro que a situação no Cazaquistão se transformou em uma consequência direta da tragédia que se abateu sobre todos nós há trinta anos. O desmoronamento da União Soviética, a rejeição do sistema socialista e do poder soviético geraram muitos obstáculos aos novos Estados “independentes e democráticos”. O capitalismo primitivo, no qual submergiram as repúblicas pós-soviéticas, inevitavelmente condenou os trabalhadores ao empobrecimento e à privação de direitos, levando a um cenário de desigualdade flagrante. Ao mesmo tempo, nossos povos se tornaram extremamente vulneráveis às ameaças externas.

 

Contrariando as promessas dos acadêmicos liberais, os novos Estados não se tornaram membros plenos do “mundo civilizado”. O capital global os relegou ao papel de apêndices das matérias-primas e do mercado, fontes de mão-de-obra barata e peões das aventuras geopolíticas das potências imperialistas.

 

Por essa trilha de instabilidade transitou o Cazaquistão. As indústrias de manufaturas avançadas mergulharam no abismo da privatização. O setor de commodities foi cedido ao capital estrangeiro. No campo de petróleo e gás, corporações como a Chevron e Exxon Mobil (Estados Unidos), Total (França), Royal Dutch Shell (Reino Unido e Holanda) se consolidaram. O novo dono da indústria do aço é a transnacional Arcelor Mittal.

 

A estreita conexão com o capital estrangeiro beneficiou a jovem burguesia do Cazaquistão e aqueles que ajudaram a promover a exploração dos recursos de mão-de-obra e matérias-primas do país. Como na Rússia e na Ucrânia, esses setores se apropriaram de tudo o que foi possível no processo de “acumulação primitiva de capital”. Além disso, muitas das pessoas que se tornaram as mais ricas do país acabaram se fundindo com o poder. Como em quase todo o espaço pós-soviético, se criou no Cazaquistão um sistema oligárquico-comprador típico do capitalismo selvagem.


A desigualdade tem aumentado constantemente no país. Apenas as migalhas da renda nacional foram distribuídas ao povo. A divisão da propriedade e a tensão social aumentaram. Em 2011, uma greve dos trabalhadores do petróleo, na cidade de Zhanaozen, durou vários meses e terminou em confrontos, que resultaram na morte de 16 pessoas. As autoridades mostraram claramente a sua postura para com o povo, ao aumentar a idade de aposentadoria para 63 anos, tanto para os homens quanto para as mulheres.

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A pandemia do coronavírus foi o fator que finalmente destruiu o mito da “paz social” no Cazaquistão. Até a taxa oficial de pobreza aumentou. Tomando como base o padrão global de necessidades mínimas de 5,50 dólares por dia, pode-se dizer que um em cada sete residentes do país é pobre.

 

De acordo com pesquisas, a proporção de pessoas que está sem comida aumentou de 3% para 13%. Outro setor da população, cerca de 44%, admite que tem recursos suficientes apenas para comprar comida. Ao mesmo tempo, o número de bilionários em dólares no primeiro ano da pandemia aumentou de quatro para sete, e suas fortunas combinadas quase dobraram.

 

Nos últimos dois anos, as greves em empresas do Cazaquistão não pararam. As manifestações mais massivas aconteceram nas regiões ocidentais. Por serem o petróleo e o gás os dois principais produtos de exportação, também afetam o nível de desigualdade do país. Milhares de pessoas ficaram indignadas com os atrasos nos salários e as demissões e passaram a exigir pagamentos mais elevados em meio a um aumento contínuo dos preços. De acordo com os dados oficiais, a inflação dos alimentos no país foi de 20% nos últimos dois anos.

 

As justas demandas de cidadãos descontentes foram ignoradas pelas autoridades. A assistência social durante a pandemia foi claramente insuficiente. Também houve descontentamento da população pelas rígidas medidas de quarentena. Assim como a Rússia, o Cazaquistão experimentou uma devastação dos serviços de atendimento médico, que afetou diretamente a preparação para epidemias.

 

Algumas das medidas tomadas pelas autoridades foram vistas pelo povo como um escárnio. Por isso, no outono, o presidente do país prometeu aos cidadãos que eles poderiam usar parte das economias guardadas para a sua aposentadoria. Poucos dias antes do ano novo, porém, o “patamar de suficiência”, valor mínimo acumulado acima do qual são permitidos saques, foi aumentado drasticamente. Para pessoas entre 59 e 62 anos, será de mais de 9 milhões de tenges (cerca de R$ 116 mil). Porém, o número de proprietários dessas “enormes reservas” é muito pequeno.

 

Em vez de resolver os problemas sociais, a classe dominante preferiu dividir a sociedade, alimentando a russofobia e a inimizade entre etnias. Nos livros escolares, os jovens cazaques aprendem sobre o “colonialismo russo” e o “totalitarismo soviético sangrento”. Oficialmente, uma campanha abrangente de reabilitação foi lançada para todas as “vítimas da repressão”, incluindo colaboradores do lado de Hitler. Se construíram monumentos a figuras que colaboraram com o fascismo, como o Mustafe Shokai. Seus nomes foram usados em ruas e escolas. As autoridades especulam cada vez mais sobre o tema do “Holodomor do Cazaquistão”, distorcendo grosseiramente os fatos históricos. Forças nacionalistas próximas ao governo exigem diretamente o reconhecimento da fome como um “genocídio” e a realização de um “desmantelamento final”.

 

Esse clima destrutivo no país alimenta o processo pelo qual os últimos monumentos a Lenin estão sendo demolidos. Ruas, bairros, vilas e cidades inteiras estão mudando de nome. Uma nova onda dessa Páscoa política varreu o Cazaquistão no final do ano passado. Dezenas de ruas foram rebatizadas, entre outras cidades, em Uralsk e Semey (anteriormente Semipalatinsk). Em Karaganda, o distrito de Oktyabrsky leva o nome de Alikhan Bukeykhanov, o líder do partido burguês Alash – que, em aliança com Kolchak e Ataman Dutov, lutou contra o governo soviético.

 

Apesar da amizade oficialmente proclamada entre os povos, o governo do Cazaquistão constantemente reduz o alcance da língua russa, discriminando os cidadãos que falam esse idioma. No final do ano passado, o parlamento do país aprovou um projeto de lei que permite a publicação de informações visuais exclusivamente em idioma cazaque. Também está sendo realizada uma transformação completa do alfabeto cazaque, planejada para terminar em 2025, vinculando-o mais ao alfabeto latino que ao cirílico.

 

Esse tipo de política levou a uma saída massiva da população de origem russa. A proporção de russos no país diminuiu durante o período pós-soviético, de 38% para 18%. Assim, em 2019, 45 mil pessoas deixaram esse território, entre as quais 85% são russas, ucranianas e alemãs. No Cazaquistão, existe um programa estatal para o reassentamento de cidadãos de nacionalidade cazaque, principalmente no Norte, em regiões onde predomina a língua russa.

 

As “patrulhas linguísticas” tornaram-se um fenômeno repugnante, humilhando os residentes de outras etnias. Exigem das vítimas um pedido de desculpas por elas não conhecerem o idioma cazaque. As autoridades têm feito vistas grossas sobre esses casos há muito tempo. A lenta condenação de tais ações ocorreu somente depois de ampla ressonância na mídia russa.

 

Esta política de discriminação idiomática foi apoiada por numerosas ONGs pró-Ocidente que se instalaram no país. O próprio governo, apesar de falar em apoio à integração eurasiana, flertou simultaneamente com as capitais ocidentais. As relações com os Estados Unidos atingiram o patamar de “parceria estratégica ampliada”. Todos os anos, são realizados exercícios militares “Águia da Estepe”, em conjunto com a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Foram construídos, em cooperação com os norte-americanos, diversos biolaboratórios, cujas investigações levantam muitas suspeitas para especialistas locais e estrangeiros.

 

Além disso, para agradar os nacionalistas, o governo do Cazaquistão atua metodicamente para destruir a oposição de esquerda. Tanto os comunistas quanto os sindicatos independentes vem sendo alvo de fortes pressões.

 

Nesse contexto, houve uma explosão social no país. A razão direta foi aguda: o aumento do custo do preço do gás de cozinha (GLP), duas vezes em poucos dias! Antes disso, as autoridades anunciaram uma mudança a “preços mais de acordo aos valores do mercado” e uma eliminação total dos subsídios. O oeste do Cazaquistão se tornou um foco de protestos.

 

Em primeiro lugar, o gás de cozinha (GLP) é usado no Cazaquistão principalmente para aquecer casas e abastecer veículos. Em segundo lugar, o combustível é produzido justamente nessa região, pelo esforço de muitos de seus habitantes, mas propuseram às pessoas que esquecessem desse detalhe e que “se submetam ao livre mercado”. Em terceiro lugar, o oeste do Cazaquistão sofreu os piores efeitos das ondas anteriores desta crise gerada pelas reformas, situação que deslocou o centro das atividades de protesto para essa região.

 

Em questão de dias, a indignação se espalhou para outras regiões do país. Inicialmente, os protestos foram pacíficos. Os participantes dos atos exigiam preços mais baixos, salários e benefícios mais altos, insistindo no retorno da idade da aposentadoria aos parâmetros anteriores. Em solidariedade aos manifestantes, trabalhadores em vários campos de petróleo entraram em greve.


No entanto, a situação mudou rapidamente e saiu do controle. Os primeiros atos de terror e vandalismo foram cometidos nas cidades de Zhanaozen e Aktau, na região de Mangistau, no sudoeste do Cazaquistão. Em seguida, os distúrbios se transformaram em confrontos violentos em Almaty e em outras cidades. Em particular, os aeroportos de Aktobe, Aktau e Almaty foram paralisados. Havia uma ameaça à segurança do cosmódromo de Baikonur. Grupos de jovens armados atacaram as forças de segurança, capturaram e destruíram edifícios, ameaçaram médicos, bombeiros e civis. Uma onda de saques varreu as cidades.

 

É claro que atos destrutivos são cometidos por aqueles que nada têm a ver com a maioria dos manifestantes. Grupos criminosos usam discursos populares no Cazaquistão para atingir seus próprios objetivos. Em primeiro lugar, essas são células islâmicas radicais. Sua atividade se diferencia pela crueldade demonstrada contra as forças de segurança. Tentaram cortar cabeças dos agentes. Em resposta, estes também intensificaram o seu atuar, primeiro em Almaty, considerado um tradicional bastião do pensamento liberal. Aqui estão os escritórios de um número significativo de ONGs pró-Ocidente. Finalmente, os crimes relacionados a grupos nacionalistas se disseminaram. Os ataques seletivos contra edifícios governamentais e prestadores de serviços especiais, incluindo incêndios, roubo de armas, invasões de lojas e outros locais públicos mostram isso.

 

Não se pode excluir que as ações de todas essas forças foram coordenadas a partir de um centro que operava em favor da desestabilização do Cazaquistão. Mas é impossível retirar a responsabilidade da liderança do governo pelo fato de que os funcionários toleraram as atividades das forças pró-Ocidente e tomaram uma posição conciliadora com relação aos grupos islâmicos. O Comitê de Segurança Nacional do país rejeitou vários pedidos para banir o salafismo (wahhabismo), disseminado por pregadores treinados na Arábia Saudita e em outros países árabes que operam no Cazaquistão.

 

Nosso país tem a obrigação de examinar todo o curso dos acontecimentos em um amplo contexto internacional. Nos últimos meses, a situação político-militar nas fronteiras ocidentais da Rússia se deteriorou claramente. A pressão econômica, midiática, diplomática e militar sobre nossa potência só aumentou. A mídia ocidental, os diplomatas, políticos e representantes da OTAN manifestam repetidamente e em alta voz a sua “preocupação” ostensiva sobre os planos de um “ataque à Ucrânia” e ameaçaram Moscou com “medidas preventivas abrangentes”.

 

No contexto do agravamento da situação em nosso país, recebemos um golpe nas fronteiras do Sul. Com a chegada do novo ano, os oponentes da Rússia no cenário mundial aumentaram dramaticamente as apostas no “grande tabuleiro de xadrez”. No dia 2 de janeiro, o povo do Cazaquistão foi surpreendido pelo “presente de ano novo” das autoridades: um aumento nos preços do gás (GLP). A reação indignada da população foi imediatamente aproveitada pelo submundo terrorista, cuja liderança se baseia na experiência de combate dos jihadistas na Síria e no Iraque. Ações em grande escala foram organizadas para desestabilizar a situação. Os representantes da clandestinidade conseguiram, por um lado, fundir-se com as massas de manifestantes e, por outro, contar com elementos desqualificados e criminosos.


Até o momento, milhares de pessoas sofreram ações criminosas. Centenas de pessoas estão hospitalizadas, dezenas estão em tratamento intensivo e também há vítimas fatais. Manifestantes obstruem o trabalho de ambulâncias e instituições médicas, usam armas de fogo, intimidam a população, roubam lojas e saqueiam. A natureza de suas ações é indicativa de medidas planejadas, coordenadas e financiadas do exterior.

 

O presidente do Cazaquistão anunciou o Estado de emergência no país e fez o governo renunciar. Devido à magnitude dos acontecimentos e à intervenção de forças externas, as autoridades do país pediram ajuda aos parceiros. O Conselho de Segurança Coletiva da OTSC decidiu fornecer essa assistência para estabilizar a situação na República do Cazaquistão.

 

Segundo o Partido Comunista da Federação Russa, esta é uma medida forçada, mas adequada e oportuna, destinada a apagar as chamas de mais uma “revolução colorida”. O Partido Comunista da Rússia condena veementemente as ações da reação internacional e de elementos criminosos. Consideramos totalmente inaceitáveis a intervenção em assuntos internos do Cazaquistão e as tentativas de desestabilizar a Ásia Central, que constituem uma ameaça direta ao nosso país.

 

O Partido Comunista da Federação Russa é a favor do retorno do Cazaquistão a um caminho pacífico. Acreditamos que a principal tarefa do contingente de manutenção da paz é proteger os objetivos estratégicos que visam assegurar a vida normal dos cidadãos. A população do Cazaquistão deve ser protegida dos ataques terroristas de jihadistas, que vem utilizando “táticas de intimidação”.

 

Confiamos que a missão de manutenção da paz da OTSC ajudará a estabilizar a situação na região da Ásia Central. No entanto, consideramos que o contingente de manutenção da paz deve ser utilizado apenas para os fins indicados. A participação do pessoal de manutenção da paz em confrontos internos entre clãs e facções dominantes é inaceitável.

 

Para o governo do Cazaquistão, seria um erro seguir o caminho de perseguir os manifestantes pacíficos, listando todos eles como “terroristas” e “militantes”. Acreditamos que o governo deve iniciar um diálogo imediato entre os trabalhadores e as autoridades políticas. Também deve se esmerar em atender prontamente às justas demandas da população para melhorar a situação socioeconômica.

 

O Partido Comunista da Federação Russa considera que é hora de frear a política russofóbica e anti-soviética no Cazaquistão. Para isso, é indispensável fazer uma análise cuidadosa das atividades de organizações pró-Ocidente e da mídia. Tais atividades transformaram o país em um centro de operações das forças antirrussas durante anos, moldando a população e atentando contra a amizade com nosso país.

 

Chegou a hora de uma discussão honesta e da erradicação das causas fundamentais da desastrosa divisão social, não apenas no Cazaquistão, mas também na Rússia. Para o nosso país, houve outro sinal formidável de que as políticas que criam divisão, desigualdade e pobreza inevitavelmente sobrecarregam a paciência do povo. Trabalhando pelos interesses dos oligarcas, jogando “migalhas da mesa” aos trabalhadores, qualquer governo certamente enfrentará o desafio de ter que responder por suas ações. Nesse momento, não contará com a ajuda nem da dura repressão, nem do ópio do nacionalismo, nem das mentiras dos partidários anti-soviéticos e russofóbicos.

 

A conclusão mais importante sobre os acontecimentos no Cazaquistão é que as tentativas da burguesia nacional de integrar seus povos ao mundo do capitalismo global os transformaram em marionetes da oligarquia mundial. O interesse fundamental dos povos da Rússia, do Cazaquistão e de todos os outros Estados é o de abandonar esta política desastrosa. Hoje, mais do que nunca, está em alta o nosso programa “Dez Passos para uma Vida Digna” e a experiência única de empresas populares. Não ao capital estrangeiro! Não ao capital “local”! As massas trabalhadoras devem tornar-se donas de seus países!

https://www.alainet.org/es/node/214703
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