Licenciamento ambiental como instrumento de desenvolvimento

24/03/2017
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Não são raras as vezes em que o licenciamento ambiental de atividades econômicas é tratado como o principal “vilão do desenvolvimento”. Trata-se de uma visão equivocada, normalmente assentada sobre dois alicerces que são a incompreensão do processo de licenciamento ambiental e a incorreção conceitual sobre desenvolvimento.

 

É comum vermos a confusão entre desenvolvimento e o simples crescimento da economia. A matemática errada é traduzida da seguinte forma: mais produção, maior crescimento do PIB, maior o desenvolvimento. Trata-se de uma ideia superada pelas visões mais complexas que incorporam elementos como educação, saúde, qualidade de vida, distribuição e direitos fundamentais. Desenvolvimento, de forma sintética, é a plena realização dos potenciais humanos e sociais. Logo, não é um conceito matemático, mecânico, mas uma expressão que carrega junto a perspectiva da inclusão, do equilíbrio e da distribuição de oportunidades.

 

Qual é o país mais desenvolvido, aquele onde poucos possuem qualidade de vida e a economia cresce em patamares elevados ou aquele onde existe maior distribuição de renda, maior qualidade de vida e a atividade econômica possui uma percpectiva de evolução equilibrada? Vale à pena destruir todo a nossa biodiversidade e transformar o planeta em um deserto, ou é melhor garantir a conservação do patrimônio ambiental e pensar nas futuras gerações e na preservação das outras espécies? A palavra-chave para entender o desenvolvimento é equilíbrio. Sem equilíbrio, sem qualidade de vida e sem distribuição dos benefícios derivados da atividade social, não temos desenvolvimento, mas o mero crescimento da atividade econômica.

 

O processo de lienciamento ambiental é tido por muitos burocrático, demorado e incompreensível. Alguns chegam a acusar os profissionais que atuam no campo de licenciamento de meros militantes, “os verdinhos”. Não se discute as condições de trabalho dos profissionais, se o número de profisionais que atuam no controle ambiental é adequado ou se a dinâmica administrativa é contempla todas as necessidades sociais ou, ainda, se os problemas estão em outros locais. Isto não quer dizer que muitas reclamações não tenham fundamento, especialmente no que se refere à eficiência administrativa.

 

Foi por este motivo que foi realizado em Rio Grande, em setembro de 2016, o seminário “Municipalização: construindo um novo paradigma para ao licenciamento ambiental”, organizado pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG e pela Secretaria de Município do Meio Ambiente – SMMA. Na época, em uma iniciativa inédita no país, foi aberto a todos os participantes a “caixa-preta da administração” e a dinâmica do funcionamento do órgão ambiental e do licenciamento ambiental, resultando na publicação da “Carta de Rio Grande”. Mas o que foi demonstrado no seminário e que poucos ainda perceberam, é que o licenciamento ambiental pode ser a solução de muitos problemas produzidos pela burocracia administrativa, especialmente devido à sua amplitude como instrumento de gestão. Na prática, o licenciamento ambiental pode abarcar o conjunto dos demais procedimentos licenciatórios (urbanístico, sanitário e de atividade, dentre outros), reduzindo drásticamente a burocracia. Trata-se de uma medida que depende de mapeamento técnico e do conhecimento pleno das atividades de gestão e, obviamente, envolve o enfrentamento de conflitos políticos e técnicos.

 

O problema é que a maior parte dos gestores públicos não busca conhecer com profundidade o sistema e ainda pensa dentro das “caixinhas” existentes, motivo pelo qual propomos uma ruptura de paradigmas. Mas para que a estratégia de simplificação dos processos de licenciamento tenha resultado, dependemos, obrigatoriamente, da municipalização, e só isto representa um conflito gigantesco que nvolve a ruptura com um modelo oligárquico construído ainda na ditadura militar.

 

Mas como enfrentar esta transição? Como já disse, o desconhecimento do sistema é um dos grandes inimigos de qualquer projeto de modificação e, além do mais, este trabalho não pode ser conduzido como uma aventura. Em geral, o personalismo dos administradores e a falta de compromisso com projetos de longo prazo são contrários à dinâmica evolutiva do licenciamento ambiental. Além disso, o tratamento dos órgãos ambientais como estruturas políticas de segunda classe, sujeitas à barganha ou ao desmonte (vejam o exemplo do que foi feito com a SMAM, em Porto Alegre), também é prejudicial ao aperfeiçoamento do licenciamento ambiental.

 

Um bom caminho para melhorar a política de licenciamento ambiental é a continuidade, não só de quadros políticos e técnicos, mas de sistemáticas de pensamento, o que nos motivou a formalizar, em 2015, um convênio entre a SMMA e a FURG pelo período de 5 anos para aperfeiçoar o licenciamento ambiental. Também é preciso envolver os servidores públicos na discussão, pois estes são os principais atores da gestão pública. Isto sem contar o imperativo debate com a sociedade civil organizada e com o próprio segmento empresarial, a chamada participação, como foi feito no seminário de setembro de 2016.

 

Todavia, e isto é fundamental, precisamos de gestores públicos que sejam capazes de aprender e pensar à frente, superar a visão individualista e eleitoreira de curto prazo. Quanto interesses outros, que não o interesse público, dominam a administração, todos perdem, e projetos novos, dinâmicos, que podem alavancar um desenvolvimento equilibrado, são perdidos.

 

- Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais, ex-Secretário de Meio Ambiente de Rio Grande/RS.

 

https://sustentabilidadeedemocracia.wordpress.com/2017/03/24/licenciamento-ambiental-como-instrumento-de-desenvolvimento/

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/184339
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