O caminho é a comunicação popular

Resgata condições de produção e reprodução social do sentido, às dinâmicas de organização e mobilização que são os nós fundamentais para empreender processos de transformação.

19/07/2016
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ALAI 25 años, por Pavel Egüez alai 25 anos
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Artigo publicado em espanhol na Revista América Latina en Movimiento No. 513, 514: A comunicação em disputa 04/07/2016

Atacar tudo que lembre minimamente democratização da comunicação — eixo estratégico para superar as assimetrias existentes e desmonopolizar a palavra em benefício de um maior pluralismo e diversidade —, parece ser uma das prioridades dos governos de direita, legítimos e ilegítimos, na região. Numa canetada e para começo de conversa, Mauricio Macri, ao assumir seu mandato na Argentina, praticamente desmontou a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual via decreto executivo, para proteger o rol de monopólios midiáticos que gravitaram em torno de sua eleição. Esta lei, uma das mais discutidas da história do país, foi aprovada em 2009 como resultado de uma trabalhosa construção cidadã com a participação de múltiplos setores sociais e políticos.

 

No Brasil, onde está em curso um golpe palaciano promovido por poderes fáticos (empresariais, midiáticos, setores judiciais, policiais e da direita parlamentar), o presidente interino Michel Temer não só está tentando fechar o Ministério da Cultura, como também intervir ilegalmente na Empresa Brasileira de Comunicação, órgão criado em 2007 para gestionar as emissoras públicas federais de rádio e televisão. De fato, uma das pouquíssimas medidas adotadas neste campo pelo ex-presidente Lula.

 

A mensagem é clara: não basta a eles uma poderosa blindagem midiática, querem ainda limitar as conquistas (maiores ou menores) inscritas na perspectiva da democratização do campo comunicacional. E mais, pelo caráter antipopular das políticas que contemplam seus programas neoliberais, buscam inclusive aniquilar qualquer espaço de manifestação pública.

 

Uma luta incansável

 

Durante a campanha eleitoral de 2010 no Brasil, a presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Maria Judith Brito, declarou sem grandes rodeios: “Os meios de comunicação assumiram de fato uma posição opositora neste país já que a oposição está profundamente fragilizada”. E, precisamente por essa função de articuladora política assumida pela grande mídia, nasceu o qualificativo Partido da Imprensa Golpista (PIG, na sigla em português), que hoje representa um papel-chave no golpe direcionado à imposição do poder econômico sobre a decisão democrática.

 

Pelo mesmo motivo, em 5 de maio passado, o país foi cenário da “Jornada Nacional de Luta contra o Golpismo Midiático”, com diversas manifestações públicas, para denunciar “como o monopólio privado nas comunicações, representado principalmente pelas Organizações Globo, fere nossa democracia, a liberdade de expressão e o direito à comunicação”.

 

Convocada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e pela Frente Brasil Popular (FBP), esta jornada é um testemunho vibrante da disputa enfrentada no campo comunicacional em nossa região: o anseio de forças populares por fazer valer o direito à comunicação frente a uma estrutura midiática concentrada nas mãos de poucas famílias ou corporações, que pretende definir o destino de nossos países.

 

Uma das mudanças registradas na região é justamente o fato de ter sido incorporado ao debate público o assunto das regulações do sistema midiático, antes considerado um tema proibido. E isto se deu sobretudo por meio da revitalização de movimentos pela democratização da comunicação. Anteriormente, esta causa estava circunscrita a alguns atores envolvidos diretamente neste âmbito e agora é assumida por uma pluralidade de setores sociais e políticos.

 

No campo dos governos progressistas, em que prevalece inicialmente um sentido “pragmático” de buscar “entendimentos” com os pesos pesados do poder midiático hegemônico, com o tempo e no calor da disputa política em alguns países se abre espaço ao reconhecimento do direito à comunicação em marcos constitucionais e em leis específicas. Em alguns casos como resultado de uma construção cidadã, em outros como sequela de uma correlação de forças.

 

No entanto, pela lentidão e limitações na implementação de tais disposições legais, as mudanças ocorridas ficam muito fragilizadas e expostas a uma permanente investida do poder midiático, que se movimenta de forma bastante sincronizada, nacional e internacionalmente, em torno de eixos estratégicos definidos, com ofensivas comunicacionais integrais e sobre a base de um tecido bem articulado composto por diversos setores (partidos políticos, ongs, think tanks, setores acadêmicos, grêmios etc.).

 

Enfoques

 

É possível observar por trás deste cenário as dificuldades de se articular políticas e estratégias comunicacionais, tanto nas esferas oficiais como nos movimentos políticos e sociais que propiciam tais transformações. Daí a persistência de atitudes reativas, presas às matrizes dos opositores, e de respostas dispersas e fragmentadas que primam por gesticular, geralmente em tom panfletário, quando no plano das ideias o que importa é enfrentar os slogans do oponente, com o eixo focado na contundência argumentativa própria.

 

A nosso ver, isto se dá em grande medida porque prevalece uma visão instrumental da comunicação limitada à ferramenta unidirecional voltada para a informação e a diversão, com os mesmos padrões e formatos definidos pelo poder do sistema dominante. Consequentemente, a comunicação fica reduzida à mídia massiva e ao marketing (por extensão às redes digitais), deixando à margem outras expressões comunicativas e artísticas. Além disso, essa visão deixa de lado o componente relacional e dialógico próprio dessa atividade humana, redundando no divórcio entre comunicação e cultura.

 

Diante da necessidade de analisar com precisão o curso dos acontecimentos, convém lembrar que durante décadas, a partir de um posicionamento crítico a tal enfoque, a comunicação popular assumiu que, para além de transmitir, importa compartilhar, em termos de diálogo e participação. Pelo mesmo motivo, resgata condições de produção e reprodução social do sentido, dando particular importância às dinâmicas de organização e mobilização que são os nós fundamentais para realmente empreender processos de transformação. Como na luta pelas transformações a disputa ideológico-cultural é a de maior transcendência, pois encara de frente a questão da hegemonia. É esta perspectiva que precisa ser potencializada em todos os níveis como suporte chave para o protagonismo popular se tornar efetivo em tempos complexos.

 

 

- Osvaldo León, comunicólogo equatoriano, é diretor da revista América Latina em Movimento.

 

Artigo publicado na edição de junho 2016 da ediçao em portugês da revista América Latina en Movimiento: “La comunicación en disputa” http://www.alainet.org/pt/revistas/513-514 (ALAI - SENGE-RJ)

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/178898
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