Povo pacífico não faz revolução

12/02/2014
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Apesar da insatisfação generalizada, estamos longe de qualquer revolução através de uma guerra civil. O país é muito grande tanto em termos de espaço territorial, como em número de habitantes. Com todas as diferenças sociais, ainda se tem muito espaço político, para suportar as dificuldades da sociedade. Como dizia Pero Vaz de Caminha “nesta terra tudo que se planta dá”. Por mais miséria que se tem não existe gente morrendo de fome.
 
Há certa preocupação, tanto pelo lado político, como pela visão sociológica, por uma eventual guerra civil, fruto de uma Revolução, como hoje ocorre no Iraque, na Síria, Afeganistão e Egito e mesmo em diversas regiões da África. Por sermos uma amálgama racial e de história muito recente, não se formou ainda ranços milenares como ocorre com aqueles países. Lá se discute rixas dos tempos bíblicos que apesar dos ensinamentos de Cristo da tolerância e do perdão, não conseguiram ainda dar as mãos.
 
Revolução pressupõe-se uma ruptura de um modelo de civilização, ou mesmo político e conjuntural. Ou ainda implantação de um conjunto de novos valores sociais, morais.  O que ocorre no Brasil é uma insatisfação generalizada da sociedade, com a má administração, falcatruas que permite as instituições, e mesmo uma silenciosa mágoa da destruição de valores tradicionais e religiosos, promovida por legislações à interesse de grupos minoritários. Mas, mesmo assim não se pode dizer de revolta generalizada, porque algumas políticas adotadas (bolsa família, vale gás e outras ajudas sociais) têm servido a uma grande multidão excluída pelo modelo socioeconômico. E isto faz diferença.
 
Estranhamente, as movimentações foram espontâneas, mas aglutinadas através das redes sociais da Internet. Alguém com algum carisma pessoal na rede, vê a oportunidade de manifestação, nas suas trocas de opiniões, levanta a questão e leva uma multidão para as praças em contestação silenciosa.
 
O grau de insatisfação é de caráter apartidário e confuso. Não há agenda a priori de reivindicações. As cenas televisivas que diariamente saem, sobre a miséria, pobreza, mau atendimento hospitalar, abandono da educação, violência urbana etc. formam um caldo psicológico nas pessoas, que a um simples gesto de conclamação, impulsiona toda uma população a saírem as ruas.  Todos levam uma bandeira: “algo está errado com o Brasil”. 
 
Existem outros fatores subjetivos, que fazem parte destas insatisfações, mas não aparecem nos cartazes reivindicantes, como inflação que atinge a todos indistintamente; aumento de preços onde indiretamente a moeda está perdendo seu valor com aumento do dólar; crescimento industrial pífio, com o fantasma do desemprego etc. Um cenário nada animador; incertezas políticas e econômicas no cenário internacional. Há ainda uma crescente angústia, pela polarização partidária, por um único partido (PT).  Esta asfixia política está levando o país a falta de novos horizontes e novas possibilidades políticas. 
 
O problema é que as multidões que estão saindo às ruas não sabem expressar isso de forma coerente e clara. Não há produção de um documento ou de um manifesto que materializem esta imensa insatisfação.
 
A passividade dos protestos, sem barulho, apenas gritos limitados pela voz humana tem um efeito plástico bonito na televisão, mas de efeito prático nenhum, embora para a classe política é um aviso considerável. 
 
Nas palavras do filósofo Ivanaldo Santos, “havia uma mão invisível dos partidos da extrema esquerda. Partidos que ainda vivem no século XIX, nunca chegaram ao século XX, muito menos no século XXI. Eles sonham com uma revolta popular, generalizada para criar no Brasil, uma versão das comunas de Paris lá dos idos século XIX. Esquecem que atual geração não tem qualquer interesse em revoluções ideológicas e guerras urbanas violentas. Ela está mais preocupada com melhor padrão de vida, com mais consumo, do que qualquer ideologia que seja oferecida. A exteriorização das reivindicações de ruas tem mais um caráter festivo, típico de nossa cultura escrachada.
 
Manifestação sem liderança moral convincente não funciona.
 
 
 
Sergio Sebold, 72 – Economista e Professor independente – sebold@terra.com.br.
 

   

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