A crise é grave e atingirá todo povo brasileiro

03/12/2008
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NAS ÚLTIMAS semanas, a imprensa corporativa tem dado destaque aos sinais, fatores, causas e conseqüências da crise. No início, o debate girava em torno de falsas polêmicas, como, por exemplo, se a crise era do capitalismo ou apenas do capital financeiro. Depois, mudaram o enfoque, abordando se a crise era dos Estados Unidos e também da Europa, ou quem sabe mundial. Em seguida, passaram a abordar se a crise era duradoura ou passageira, cíclica ou estrutural.

A verdade é que poucos analistas trataram com profundidade e buscaram de fato explicar a natureza da crise, sua gravidade e conseqüências. Primeiro, pelo que se viu dos jornalistas e dos colunistas econômicos de plantão, o fato é que eles não sabem explicar; a maioria tem formação neoclássica. Segundo, aderiram com “mala e cuia”, como dizem os gaúchos, às teses do neoliberalismo, nas quais o mercado é o Senhor, regula tudo e todos. Terceiro, por não estudarem, ficam como papagaios repetindo a vontade do capital expressa nas declarações de suas fontes empresariais. Agora, diante da crise, além de não saberem explicar, ficam constrangidos com suas próprias contradições. Conclusão: os comentaristas da grande imprensa foram todos desmoralizados junto com seus patrocinadores doutrinários. O fetiche do mercado os “enganou”.

Como consequência, os leitores e telespectadores acabam tendo diariamente apenas o relato dos fatos, não explicados, dos sintomas de uma crise grave, profunda, cíclica, estrutural, mundial, e que, provavelmente, será muito prolongada.

Enquanto isso, os assessores do governo Lula parecem mover-se apenas pelo que lêem nos jornais. Muitos deles, inclusive, esqueceram o que estudaram no velho Marx. As explicações do governo para a sociedade seguem o sabor da superficialidade, e, em alguns casos, da irresponsabilidade defendida pela imprensa. Durante várias semanas foi repetido que o Brasil era protegido por Deus, que a crise não chegaria aqui, que tínhamos bases sólidas, reservas em dólar etc., etc., etc.

Mas a realidade é outra. A cada dia estamos assistindo as conseqüências dessa crise baterem à porta de todo povo brasileiro. As vendas da indústria automobilística caíram 25%, muitos setores já deram férias coletivas para os trabalhadores e o desemprego cresce. Projetos de investimento são adiados. Isso, justamente nesse setor que é a locomotiva do capitalismo industrial dependente. Além disso, a indústria de calçados está desempregando em massa, há deficit na balança de pagamentos. Sadia, Nestlé e outras empresas do agro jogaram todo peso da crise sobre os pequenos agricultores, baixando o preço pago pelo leite, frango e porco em mais de 30%. Sem baixar o preço no supermercado, é claro.

Frente a isso, o governo tomou até agora apenas medidas para proteger os interesses das empresas. As notícias dão conta de que foram injetados 158 bilhões de reais em fi nanciamento barato para os capitalistas. Há uma medida provisória que autoriza o senhor Meirelles a fazer o que quiser com nosso dinheiro. A taxa de juros continua lá em cima. O governo segue garantindo a taxa de 14% ao ano aos banqueiros. E os bancos cobram até 68% ao ano nas prestações dos consumidores. São as mais altas taxas de juros do mundo. Já nos países ricos, cobra-se apenas de 2% a 3% de juros ao ano.

No dia 26 de novembro, o presidente Lula tomou a sábia iniciativa de convocar todos os movimentos sociais do país para debater a crise. Militantes e dirigentes preocupados com a gravidade da crise acorreram massivamente ao convite. Cerca de 60 entidades e movimentos mais representativos do povo brasileiro prepararam um documento com mais de 20 propostas. As sugestões são muitas e amplas. Vão desde trocar o presidente do Banco Central, mudar a política de superavit primário e aplicar esse dinheiro, que é publico, em vez de pagamento de juros, em programas de solução dos problemas do povo, como reforma agrária, educação, moradia, melhorias na saúde pública, elevação do salário mínimo etc., à necessidade de um plano de emergência e massivo de geração de empregos, com redução da jornada de trabalho, e penalização das empresas que desempregarem. Os movimentos também defenderam as iniciativas de governos da América Latina para efetivar o Banco do Sul, para colocar nossas reservas, tirando-as de Nova York, e construir uma zona de moeda comum, supranacional, fugindo do dólar e de suas armadilhas.

Os movimentos fizeram sua parte, leram e entregaram os documentos. Mas os puxa-sacos palacianos faltaram. Como o presidente não pôde comparecer por causa das chuvas em Santa Catarina, alguns espertinhos quiseram aproveitar o evento para fazer loas à ministra da Casa Civil, antecipando a campanha de 2010, destoando, vergonhosamente, da gravidade dos fatos.

A imprensa burguesa se lambusou. Uniram-se os oportunistas do Palácio com os jornalistas tucanos de plantão. Nada de debater seriamente as soluções para a crise. Para os burocratas e carreiristas partidários, só lhes interessam as campanhas eleitorais, para manterem seus cargos públicos, pagos com nosso trabalho.

Mas a história ensina que quem costuma brincar com fogo em geral sai queimado!

Todos sabemos que, quando o capitalismo entra em crise, fica ainda mais explorador, mais violento e irresponsável.

É hora do governo Lula e governos estaduais sérios convocarem todas as forças da sociedade para fazermos um grande debate sobre as medidas necessárias para proteger o povo brasileiro da sanha do capitalismo.

Editorial – Brasil de Fato – edição 301 - de 4 a 10 de dezembro de 2008

http://www.brasildefato.com.br


 
https://www.alainet.org/es/node/131240
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