Cumprimento dos DHESC pelo Brasil
11/05/2003
- Opinión
Contra Informe da Sociedade Civil sobre Cumprimento dos DHESC pelo Brasil
(Resumo Executivo)
Plaraforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais
Plataforma DhESC Brasil
Entre os dias 05 e 09 de maio, o Comitê de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais da ONU (Comitê DESC) analisa o Informe
apresentado pelo governo brasileiro sobre o cumprimento do que
determina o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais. A reunião ocorrerá em Genebra, na sede da ONU, nos
dias 08 e 09 de maio. No dia 05 de maio, representantes de
organizações da sociedade civil brasileira apresentarão seu
Contra Informe ao Comitê.
O Brasil ratificou o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais em 1992. Através deste
instrumento, reconhecido pela legislação brasileira, o País fica
obrigado a cumprir as determinações do Sistema Global de
Proteção de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU). Entre as
medidas de monitoramento para que a ONU possa saber se o País
vem cumprindo o que determina o Pacto é a apresentação periódica
da Informes de Situação no qual o governo do País deve relatar a
um Comitê especializado sobre o estágio do cumprimento do
direito em termos legislativos, judiciários e de políticas
públicas, bem como apresentar o que entende serem os principais
passos que ainda precisariam ser dados na perspectiva da
garantia universal e indivisível de todos os direitos humanos
dos seus cidadãos.
E de praxe que o Comitê, depois de receber o relatório oficial
do governo, receba um Contra Informe elaborado por organizações
representativas da sociedade civil. Com base nesses documentos,
o Comitê procede à análise e emite seu parecer acompanhado de
conclusões e recomendações. A posição do Comitê não obriga em
termos legais o governo do País a cumpri-las. Elas se
transformam em recomendações com força política e moral que, em
geral convertem-se em instrumento de negociação para que sejam
dados passos significativos na perspectiva de que os direitos
humanos sejam efetivamente garantidos naquele País.
A sociedade civil brasileira, em maio de 2000, antecipando-se ao
governo, apresentou um informe ao Comitê DESC. Foi pioneira na
apresentação deste tipo de documento, já que isto nunca havia
acontecido antes. Este ato serviu para pressionar o governo
brasileiro a apresentar o Informe Oficial, que somente ocorreu
em agosto de 2001, com quase dez anos de atraso. Agora, várias
organizações da sociedade civil, coordenadas pela Plataforma
Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais
(Plataforma DhESC Brasil), depois de coletar informações junto a
vários setores da sociedade, apresentam seu Contra Informe. Ao
longo de um ano, foram coletadas informações e sugestões junto a
entidades dos mais diversos setores e especialmente foram
identificadas propostas concretas para sugerir como de
recomendações do Comitê ao governo brasileiro. Este documento
será oficialmente apresentado em Genebra, ao Comitê DESC no dia
05 de maio em sessão aberta e pública do referido órgão da ONU.
O Contra Informe da sociedade civil é apresentado em capítulos,
tendo ao final uma lista de propostas de recomendações sugeridas
ao Comitê.
O primeiro capítulo trata do direito à livre determinação e ao
meio ambiente, os direitos dos povos indígenas, da população
negra e de outras minorias. Em linhas gerais a posição é de que
ao optar por uma posição que privilegia o ajuste fiscal e o
seguimento das recomendações do FMI, o País não caminha numa
lógica de desenvolvimento autodeterminado e que respeite e
incentive às suas populações. Além disso, o grave quadro de
desigualdade (o Brasil é o quarto país do mundo em piores
índices de distribuição de renda e riqueza, segundo o IDH/ONU) e
de discriminação atinge os contingentes excluídos da população,
especialmente os povos indígenas, a população negra, as mulheres
e crianças. Quando analisados pelo viés étnico e de gênero os
índices de desigualdade quase dobram.
O segundo capítulo trata do trabalho como direito humano. Entre
os dados mais brutais estão os seguintes: mais de 60% dos
brasileiros vivem em economia informal e sem qualquer cobertura
previdenciária e; cerca de 80% dos beneficiados pela previdência
pública recebe o equivalente a um salário mínimo). Neste
capítulo, além de apresentar uma panorâmica sobre a situação do
trabalho e de sua falta (desemprego), também se ocupa de
analisar as condições de trabalho e os direitos de salário, de
sindicalização e de greve. Não há dúvida, e o Contra Informe
ressalta esta situação que o desemprego é um dos principais
reflexos da política econômica implementada no país e um dos
principais componentes do processo de desagregação familiar e
social que gera amplos processos de violência e de
marginalização. Além disso, o documento aponta para a vergonhosa
e ainda renitente presença de trabalho escravo e de trabalho
infantil. Faz também um relato no qual demonstra a situação do
trabalho das pessoas portadoras de deficiências e dos gays,
lésbicas e travestis. No tocante ao salário, demonstra
claramente o descompasso entre o que determina o texto
constitucional (salário mínimo que segundo os cálculos do DIEESE
deveria ser superior a 550 dólares) e o valor do salário mínimo
nacional atual (em torno de 60 dólares). e o valor do salário
mínimo nacional. O relatório também mostra as brutais diferenças
na remuneração entre mulheres e homens, entre brancos e negros
quando desempenham as mesmas funções. Finalmente, o texto também
comenta sobre a flexibilização da legislação trabalhista e as
ameaças a direitos fundamentais dos trabalhadores com as
propostas de reforma da legislação do trabalho.
O terceiro capítulo é dedicado ao direito à previdência e à
seguridade social. Analisa brevemente as mudanças introduzidas
pelas recentes reformas constitucionais neste campo e aponta,
com preocupação para as novas reformas que estão sendo
discutidas.
O quarto capítulo trata do direito à proteção à família, às
mulheres, às crianças e aos adolescentes. O relatório constata a
quase ausência de políticas de ação nos sentido da proteção à
família, particularmente considerando que boa parte das famílias
pobres é chefiada por mulheres. Em se tratando de proteção à
mulher há vários problemas, tanto no mercado de trabalho quanto
a persistência da violência e da exploração sexual de mulheres,
inclusive de adolescentes e o tráfico internacional de mulheres.
A prática da esterilização em massa, que em algumas regiões do
País chegou a ser de quase metade das mulheres em idade fértil.
No tocante à política de proteção à infância e à adolescência,
salvo contar com uma das legislações mais avançadas do mundo (o
Estatuto da Criança e do Adolescente), ainda há claras situações
de violação e de carências de políticas concretas, sobretudo
para atendimento às crianças vítimas de violência ou para a
aplicação das medidas sócio-educativas para os adolescentes que
cometeram atos infracionais. O relatório também aponta para a
séria problemática da exploração sexual de crianças e
adolescentes e para o trabalho infantil.
O quinto capítulo dedica-se a analisar a situação do direito à
alimentação, à água e a terra rural. Salvas as iniciativas do
atual governo em criar programas de enfrentamento da fome, o
quadro é de um amplo descaso no sentido de garantir acesso ao
direito à alimentação e à nutrição adequadas, já que são 54
milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza, dos
quais 24 milhões estão em situação de indigência, todos,
portanto em situação de insegurança alimentar e nutricional. No
tocante ao direito à água, registra-se que há um grande
problemas de acesso à água potável tanto nas cidades quanto no
campo, estimando que 60% da população brasileira vive em estado
de insegurança quanto à água que consome. No tocante ao acesso à
terra rural, o documento aponta para a morosidade do processo de
reforma agrária e para os amplos contingentes que passam dos 5
milhões de pessoas, havendo terras disponíveis para assentar 2,5
milhões de famílias. O relatório também aponta que mais de 70%
da população rural tem renda anual que os põe abaixo da linha de
pobreza.
O sexto capítulo dedica-se à análise da situação do direito
humanos à moradia adequada. Ressalta que nos últimos anos deram-
se avanços importantes neste campo com a elevação deste direito
ao status constitucional (Emenda 26) e com a aprovação do
Estatuto da Cidade. Mostra que o intenso processo de êxodo rural
vivido pelo país nas últimas décadas criou um processo de
inchamento das cidades que, somado a ausência de políticas
adequadas de urbanização e de garantia de acesso à moradia para
as populações mais pobres tem gerado favelas, sub-habitações,
ocupações de áreas de risco, entre outras situações. Para
ilustrar, com dados do IBGE, o relatório mostra que o
crescimento da área de favela, de 1991 a 2002 foi de 22%. Com
base nos dados mais recentes, o relatório informa serem quase
4,5 milhões de famílias com renda inferior a três salários
mínimos que demandam por moradia urbana. O relatório também
aponta que somente com a implementação de políticas públicas de
subsídio será possível resolver equacionar o acesso a este
direitos fundamental. Analisando a questão pelo viés de gênero e
de etnia, o relatório revela que os mais afetados com a ausência
de moradia são exatamente mulheres e negros.
O sétimo capítulo analisa a situação do acesso ao direito à
saúde. Mesmo reconhecendo que o País conta com um dos mais
avançados sistemas de proteção do direito à saúde, o Sistema
Único de Saúde, o relatório aponta para a necessidade de avanços
concretos no sentido da universalização do acesso e
especialmente na necessidade de desenvolver políticas de
atendimento à população que apresenta demandas específicas, como
as mulheres. O Informe mostra que houve uma redução nos gastos
com saúde, indicando, por exemplo que, de 81,2 dólares per
capita em 1995, passou para 59,1 dólares per capita. O relatório
também mostra a gravidade da situação da mortalidade materna,
sendo responsáveis por 6% das mortes de mulheres entre 10 e 49
anos e está entre as dez primeiras causas de mortalidade do
País. O informe também se ocupa de analisar os problemas e o
descaso com o atendimento da saúde das populações negras.
O oitavo capítulo trata da garantia do direito humano à educação
e ao final dele um pequeno capítulo trata do direito à cultura e
ao desenvolvimento científico e tecnológico. O informe reconhece
o esforço de inclusão de crianças no ensino fundamental feito
nos últimos anos, mas ressalta que ainda são mais de 2 milhões
as crianças em idade escolar que não estão no ensino
fundamental. O relatório também chama à atenção para o quadro de
analfabetismo e a ausência de propostas consistentes de educação
de jovens e adultos. Mostra também o gargalo na oferta de ensino
médio e superior públicos e a crescente mercantilização do
ensino superior, com um crescimento vertiginoso do ensino
superior privado.
Ao final, o documento apresenta uma lista de propostas de
sugestões de recomendações que a sociedade civil brasileira
espera sejam adotadas pelo Comitê e, dessa forma possam ser
dados significativos na garantia dos DhESC. Além de um elenco de
propostas para cada área específica, o documento aponta
propostas gerais. Algumas das propostas gerais de recomendação
são as seguintes:
1. Aprimorar os instrumentos e mecanismos institucionais
encarregados da proteção dos direitos humanos, dotando-os de uma
lógica sistemática e permanente, através da implementação de um
SISTEMA NACIONAL DE PROTEÇAO DOS DIREITOS HUMANOS.
2. Reformular o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa
Humana, adequando-o aos Princípios de Paris, criando um novo
Conselho Nacional de Direitos Humanos, que abranja o conjunto
dos direitos humanos (civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais e outros), dando seguimento e reformulando o Projeto
de Lei que tramita no Senado Federal a fim de qualifica-lo,
tomando em conta as várias propostas de emenda já apresentadas
por entidades da sociedade civil.
3. Construir uma metodologia de monitoramento, avaliação e
aprimoramento permanente do Programa Nacional de Direitos
Humanos que levem a sua integral implementação, com dotação
orçamentária adequada e o cumprimento de metas periodicamente
redimensionadas.
4. Na perspectiva da realização dos direitos, é necessário que o
governo adote uma postura clara no sentido de articular as
diversas ações em políticas públicas no sentido de serem
perpassada pelos direitos humanos e que a prioridade social
esteja à frente da prioridade fiscal. Isto implica na revisão
dos acordos internacionais que ferem os direitos humanos.
5. Fazer uma opção clara no sentido de distribuir a renda e a
riqueza. Sem medidas objetivas e diretas que possam fazer com
que o País supere o estágio de estacionamento e de
condicionamento à mão dos interesses de agiotas do mercando
financeiro, não será possível que o Estado brasileiro possa
investir maciçamente em políticas públicas que venham para
romper com o ciclo crescente de ampliação da desigualdade. Não
temos dúvida que somente desta forma será possível avançar
efetivamente na realização dos direitos humanos em geral.
6. Adoção de medidas concretas para proteção das populações
vulneráveis e historicamente alijadas do acesso aos direitos
fundamentais, seja com políticas estruturais de inclusão, seja
com medidas compensatórias e reparadoras, nos casos necessários
e de maior emergência. Mas, estas políticas, precisam ser
fortemente articuladas e complementares entre si. Além do que,
têm sustentabilidade se forem implementadas na perspectiva dos
direitos humanos, da afirmação da cidadania e da participação
ativa destes setores. Medidas de cunho assistencialista e
paternalista não são bem vindas na perspectiva dos direitos
humanos.
7. É necessário ainda que os mecanismos de estabelecimento de
metas, de monitoramento e de avaliação das políticas
implementadas sejam aperfeiçoados e possam garantir ampla
participação da sociedade civil organizada. O fortalecimento e a
ampliação, portanto, dos órgãos de controle social e de
participação autônoma da sociedade civil é fundamental.
8. Aperfeiçoamento das condições de acesso à Justiça e na
qualificação das demandas e da jurisprudência em matéria de
direitos humanos, especialmente em matéria de direitos
econômicos, sociais e culturais.
9. O Brasil precisa assumir um posicionamento claro de defesa
das cláusulas de direitos humanos em todos os acordos
internacionais, especialmente os acordos comerciais.
Particularmente, entendemos que os processos de integração
econômica dos quais participa, tanto o Mercosul, quanto a ALCA,
precisam ser perpassados pela garantia de medidas que
objetivamente garantam os direitos humanos. Nesta perspectiva,
em termos interamericanos, a defesa da adoção de uma Carta
Social Continental emerge como prioridade estratégica
fundamental. Além disso, advogamos que o governo submeta à
consulta popular a proposta de integração à ALCA.
10. Posicionamento mais objetivo e contrário do governo
brasileiro junto à Organização Mundial do Comércio no que tange
à proposta de liberalização dos serviços é fundamental, visto
que, em grande medida, o assunto tem relação direta com os
instrumentos públicos disponíveis no País para a realização dos
direitos humanos.
11. Que o governo brasileiro precisa assumir uma postura de
liderança na América Latina no sentido da defesa da soberania e
da autodeterminação das nações e dos povos que aqui vivem, no
sentido de não sucumbir aos ditames e atropelos do novo
imperialismo.
12. O governo brasileiro precisa assumir uma postura mais clara
e protagonista no cenário internacional, especialmente no
sentido de fortalecer os organismos internacionais de proteção
dos direitos humanos. O processo de globalização exige que as
instituições e organismos multilaterais (ONU, OEA e seus órgãos
de proteção dos direitos humanos) sejam amplamente fortalecidos.
13. Que o governo brasileiro assuma uma postura clara em defesa
da adoção imediata pela ONU de um Protocolo Facultativo ao Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
14. Que o governo e a sociedade incentivem e contribuam na
afirmação e qualificação da experiência de monitoramento do
cumprimento dos DhESC que vem sendo construída através da ação
dos Relatores Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais
e Culturais.
APOIO
A construção e apresentação do Contra Informe contou com apoio
logístico das seguintes organizações: Plataforma Interamericana
de Derechos Humanos, Democracia y Desarollo (PIDHDD),
Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), ICCO, EuroPAD/EED,
Processo de Articulação e Diálogo entre Agências Ecumênicas
Européias e suas Contrapartes Brasileiras (PAD), Rede
Internacional para o Direito Humano a se Alimentar (FIAN
Internacional), Franciscans International, Misereor e Inúmeras
organizações e redes de movimentos sociais e ONGs do Brasil que
aportaram informações e colaboraram diretamente na
sistematização de dados.
PARA MAIORES INFORMAÇÕES
Plataforma DhESC Brasil – Secretaria Executiva
Paulo César Carbonari – Fone (54) 9983-4757 – E-mail: paulo@berthier.com.br Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH
Romeu Olmar Klich – Fone (61) 273-7320 – E-mail: olmar@mndh.org.br Federação dos Órgãos de Assistência Social e Educacional – FASE
Elena Rodriguez ou Márcio Alexandre Gualberto – Fone: (21) 2286- 1441 – E-mail: elena@fase.org.br FIAN International
Michael Windfuhr – Fone Celular: 00 49 177 388 4385 – E-mail: windfuhr@fian.org
Secretaria Internacional (Sandra Epal) – Fone: 00 49 622 1653 0032 – E-mail: epal@fian.org Hotel TOR
Local de Hospedagem da Delegação Brasileira – Fone: 00 41 22 909 8820
Paulo César Carbonari – Fone (54) 9983-4757 – E-mail: paulo@berthier.com.br Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH
Romeu Olmar Klich – Fone (61) 273-7320 – E-mail: olmar@mndh.org.br Federação dos Órgãos de Assistência Social e Educacional – FASE
Elena Rodriguez ou Márcio Alexandre Gualberto – Fone: (21) 2286- 1441 – E-mail: elena@fase.org.br FIAN International
Michael Windfuhr – Fone Celular: 00 49 177 388 4385 – E-mail: windfuhr@fian.org
Secretaria Internacional (Sandra Epal) – Fone: 00 49 622 1653 0032 – E-mail: epal@fian.org Hotel TOR
Local de Hospedagem da Delegação Brasileira – Fone: 00 41 22 909 8820
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