O voto desta semana

30/08/2002
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A partir de amanhã e durante toda a Semana da Pátria, os brasileiros têm a oportunidade de começar a definir, pelo voto, o destino do Brasil no século XXI, ao participar do plebiscito sobre a Alca e a base militar de Alcântara. A palavra plebiscito designa uma decisão tomada pelo povo. A consulta plebiscitária foi responsável por algumas das maiores conquistas democráticas contemporâneas. Na Itália, governada há décadas pela Democracia Cristã, com um presença direta do Papa e do Vaticano, através de memoráveis plebiscitos o povo italiano conquistou primeiro o direito ao divórcio e depois ao aborto. Foi também mediante plebiscito convocado mediante assinaturas populares que os uruguaios decidiram, por grande maioria, opor-se à privatização das empresas estatais. Mais recentemente, mediante consultas populares é que a cidadania européia se pronunciou sobre a unificação monetária, como locomotiva da unificação política dos países do continente, de tão grande envergadura foi considerada a medida. Ao plebiscito são submetidos temas suficientemente importantes para que a cidadania deva se pronunciar expressamente, mais ainda quando os governantes não receberam mandato explícito para tomar decisões sobre eles. Divórcio, aborto, privatizações, integração supranacional - estão entre esses temas. A proposta da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) se enquadra perfeitamente entre eles. Trata-se de uma proposta apresentada e patrocinada pelo país de maior economia do mundo, os EUA, e que, no total da América, representa cerca de 75% do ponto de vista econômico. Só esse aspecto já mereceria consideração especial, pela desproporção dos países aos quais se propõem a integração, o que caracteriza mais uma absorção do que realmente um processo de integração. Por muito menos os países europeus submeteram, pelo significa de entrega de soberania a entidades supranacionais de renúncia a legislar a nível nacional sobre políticas sociais, de emprego, de déficits públicos, entre outros, a consultas populares. Nas Américas, a pretensão norte-americana é estabelecer uma área de livre comércio mediante acordos entre governos e até mesmo de acordos bilaterais - como ocorre atualmente - para retirar todas as formas ainda existentes de defesa dos outros países do continente em relação à competição das grandes corporações norte-americanas, que além de tudo contariam com exclusividade com o mercado americano. Na sua forma atual, o projeto do governo de George Bush reserva para seu país os setores em que teria algum tipo de dificuldade para competir, de forma a que mesmo o governo FHC e importantes setores do empresariado industrial e agrícola brasileiro têm dificuldades de aceitar, quando percebem que o livre comércio é uma política unilateral por parte dos EUA. Porque na realidade se trata de parte de um projeto imperial norte-americano, da super-potência hegemônica no mundo, predominante econômica, política, militar e ideologicamente. O plebiscito em que os brasileiros poderão votar ao longo de toda a próxima semana, teve projetos de lei apresentados na Câmara e no Senado, onde ficaram empacados, e acabou sendo convocado de baixo para cima, por entidades civis e movimentos sociais, entre eles a CNBB, a CUT, o MST, diante da ausência de consulta por parte do governo em relação a um tema tão essencial. O plebiscito coloca para a cidadania a pergunta sobre a conveniência ou não da Alca e se o Brasil deve ou não seguir negociando em torno da proposta norte- americana. Como se trata de um tema integrado ao projeto imperial dos EUA, pergunta-se também sobre a conveniência ou não do Brasil ceder parte do seu território - sem nenhum poder de ingerência ou controle - para que os EUA tenham uma base militar em Alcântara, no Maranhão. Trata-se de um plebiscito popular, uma forma nova, revigorante e direta de fazer política, ampliando seu âmbito e apelando para a opinião explícita da cidadania em relação a questões essenciais, que contrasta fortemente com as formas tradicionais de prática política, em que primam o dinheiro e promovem o desinteresse pelos temas substanciais, a favor de estilos marqueteiros que despolitizam os debates. Pode-se votar em escolas, universidades, igrejas, praças públicas e tantos outros lugares, pelo Brasil inteiro. Um plebiscito similar, realizado há dois anos, sobre o pagamento ou não da dívida externa, conseguiu a participação de mais de seis milhões de pessoas, demonstrando como mesmo temas aparentemente áridos, quando se consegue que a população seja informada sobre eles, podem despertar o interesse e suscitar a participação maciça da população. O resultado - porém, mais do que isso, a quantidade de participantes - revelará o grau de consciência e de interesse que um tema essencial como o do lugar do Brasil no mundo - soberano ou subordinado - desperta na população e quanto uma campanha desenvolvida por entidades civis e movimentos sociais, sem nenhuma cobertura da mídia, pode chegar à cidadania.
https://www.alainet.org/es/node/106331
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