Mutirão Nacional para a superação da miséria e da fome

22/07/2002
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Aos Candidatos e às Candidatas a postos eletivos Miséria e fome exigem resposta política 1. Reunidas em Brasília, em 22 a 24 de julho de 2002, as entidades que subscrevem esta declaração se dirigem aos candidatos a postos eletivos – executivos e legislativos – e aos homens e às mulheres em todo o país. Manifestam a sua posição visando à superação da Miséria e da Fome no Brasil, bem como reafirmam o Direito Humano à Alimentação e à Nutrição, na sua universalidade e indivisibilidade. Esta declaração surge da mobilização da sociedade civil brasileira em torno do Mutirão para a Superação da Miséria e da Fome, lançado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em abril de 2002. 2. A fome e a miséria são manifestações e parte integrante de um modelo de desenvolvimento que reproduz e se sustenta das desigualdades econômicas e sociais que flagelam o nosso povo. Este modelo vem utilizando de forma predatória os nossos recursos naturais e humanos, colocando em risco nossa soberania alimentar. Este processo faz parte de uma estratégia de inserção do Brasil de forma submissa ao mundo globalizado. Não acreditamos no mercado como a via capaz de promover a segurança alimentar e nutricional, no contexto de uma sociedade justa e eqüitativa. Este modelo está esgotado, seja do ponto de vista ambiental e econômico, como do ponto de vista ético e social. Sua manutenção irá apenas aprofundar o quadro de crise e exclusão social que vivemos. 3. O êxodo rural e o inchaço das cidades, sem infraestrutura urbana adequada, associada à inexistência de oportunidades de inserção no mundo do trabalho, vem servindo de combustível para verdadeira explosão de conflitos e violência, tanto na área urbana como na área rural. A banalização da violência e a naturalização das desigualdades sociais e econômicas levam à falta de mobilização da sociedade por seus direitos, por um lado, e por outro, ao desenvolvimento de políticas públicas de caráter fragmentado e compensatório, que não enfrentam o problema na sua essência, gerando no campo e na cidade ações repressivas e de criminalização dos movimentos sociais 4. A sociedade brasileira precisa responder aos graves desafios que se colocam à sua existência civilizada a partir de critérios éticos que reponham a precedência do bem comum e do interesse público sobre o interesse privado; da defesa da vida sobre os interesses individuais; da prioridade dos direitos humanos sociais sobre os contratos privados e acordos comerciais internacionais; da ética pública sobre o individualismo, o clientelismo e o corporativismo. 5. O direito humano à vida assume na presente situação histórica a clara prioridade de propiciar acesso a bens essenciais hoje negados à maioria da população, como: o alimento, o teto, a terra, a água, o trabalho, a informação, a saúde e a participação política. Estes bens ou energias vitais estão hoje bloqueados, ou fortemente mitigados, ao acesso das populações mais pobres, reproduzindo, por esta via, o caldo de cultura da miséria social e da violência. 6. A construção de uma civilização brasileira solidária passa necessariamente pelo resgate do acesso a estes bens públicos e sociais, mediante o qual se inaugurará uma nova cultura de paz e não de exclusiva repressão da violência. Um dos caminhos a percorrer para esta civilização solidária requer a reafirmação universal de todos os direitos humanos, econômicos, sociais, culturais e ambientais que a constituição de 1988 inaugurou e a onda econômica neo-liberal, na contramão, interrompeu. 7. O compromisso público com a afirmação dos direitos humanos sociais requer prioridades políticas incontestáveis na construção de um modelo de desenvolvimento. Isto vai muito além da retórica. Requer políticas públicas com controle público, nas três esferas (federal, estadual, municipal), recursos orçamentários para suprir as dívidas sociais, com correspondentes obrigações sociais claramente identificadas, e instrumentos públicos de garantia de direito, e de petição e reclamo. Requer participação na elaboração, gestão e monitoramento destas políticas. E, finalmente, um reordenamento geral do sistema econômico que passaria a investir pesadamente nos bens sociais escassos. 8. O Direito Humano à Alimentação e Nutrição, no conjunto de direitos sociais que a Constituição reconhece passaria a cumprir um papel chave na nossa política de Segurança Alimentar e Nutricional sustentável. Neste contexto, há que reconhecer não apenas problemas, mas valores e saberes das comunidades, respeitando seus hábitos e estratégias de alimentação e nutrição. 9. Por outro lado, constata-se a real capacidade instalada de produção de alimentos capaz de atender às necessidades brasileiras, se for reorientada e controlada por um Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional sustentado por uma legislação apropriada (Lei Orgânica). 10. Finalmente, devemos destacar na prioridade do direito humano à alimentação, dentre as situações de máxima vulnerabilidade, aquela que afeta as crianças, desde a fase da concepção até a vida adulta, e suas mães. 11. Esta declaração é parte de um processo mais amplo de mobilização da sociedade civil em torno do Mutirão e de outras iniciativas relacionadas que têm por meta comum a construção de uma sociedade justa e eqüitativa. 12. Na qualidade de futuros dirigentes do nosso país e, portanto, assumindo a parte política da responsabilidade pela resolução dos problemas apresentados, consideramos fundamental o seu compromisso expresso com as diretrizes e propostas aqui apresentadas. 13. Ressaltamos que a sociedade civil, ao mesmo tempo em que estará atenta para qualquer tentativa de utilização do alimento ou da água como arma política, seja por meio da utilização de recursos públicos ou privados, seguirá se mobilizando em suas iniciativas, relacionadas ao tema, abaixo listadas, entre outras: - Resgatar os Direitos Sociais e o Direito Humano à alimentação no contexto da força e da legitimidade da Constituição em sua priorização do combate à miséria e à fome enquanto eixo do Desenvolvimento Humano, por meio de uma Política Social abrangente, integrada à Política Econômica; - Lutar pela Reforma Agrária ampla e irrestrita; - Apoiar a campanha nacional pelo limite máximo da propriedade da terra; - Fortalecer a agricultura familiar sustentável, com remissão da dívida dos pequenos produtores e pagamento da dívida social para com os agricultores, recuperando os hábitos e práticas alimentares que garantam uma nutrição saudável às próprias famílias e para a população do país; - Fortalecer a agroecologia no âmbito rural e urbano; - Impedir a privatização das águas; - Lutar, em defesa da soberania nacional, contra a ALCA e contra a entrega da base de Alcântara no Estado do Maranhão; - Pleitear um Brasil livre de transgênicos; - Construir um milhão de cisternas, para facilitar a convivência com o semi-árido; - Lutar pela elaboração, em âmbito global, de uma Convenção Mundial de Soberania Alimentar; - Demarcar as terras dos quilombolas e povos indígenas e respeitar suas práticas e culturas alimentares; - Propor a elaboração de uma Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional; - Lutar pela implantação do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) em nível nacional, capaz de colaborar para o diagnóstico, o planejamento de ações e o monitoramento da situação nutricional da população. Brasília, 23 de julho de 2002. ENTIDADES QUE SUBSCREVEM ESTA DECLARAÇÃO: - ABRANDH – Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos
- ActionAid Brasil
- ÁGORA – Associação para Projetos de Combate à Fome
- AS-PTA - Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa
- Cáritas Brasileira
- Cáritas Diocesana de Paracatu
- CBJP – Comissão Brasileira de Justiça e Paz
- CEPIS – Centro de educação Popular do Instituto Sedes Sapientiae
- CERIS – Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais
- CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço
- CISBRASIL – Salesianos do Brasil
- CNBB SUL III – Comissão Regional
- Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB
- Comissão Episcopal da CNBB (Dom Luciano P. Mendes de Almeida, Dom Mauro Morelli, Dom Flávio Giovanalle, Dom Sérgio Castriani, Dom Francisco A. de Mesquita Filho, Dom Sérgio da Rocha, Dom Pedro Luiz Stringhini, Dom José Mauro Pereira Bastos, Dom Manoel João Francisco, Dom José Mário Ströher, Dom Guilherme Antônio Werlang, Dom Protogenes Luft e Pe. João Roque Rohr, SJ).
- Comissão Regional do Vale do Aço
- Comitê Gaúcho de Ação da Cidadania, contra a Fome, a Miséria e pela Vida
- CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil
- CONSEA – MG
- CONSEA-MS – Conselho de Segurança Alimentar do Mato Grosso do Sul
- CPT – Comissão Pastoral da Terra
- CRB Nacional – Conferência dos Religiosos do Brasil
- EMATER – RS
- FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
- FIAN Brasil – Rede de Informação e Ação pelo Direito a Se Alimentar - Seção Brasileira de Foodfirst Network
- FMSA - Fórum Mineiro de Segurança Alimentar
- FORSANS Metropolitano (Fórum Técnico Regional de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável
- Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional
- Fórum Mineiro de Segurança Alimentar
- Grupo de Estudos e Ações em Segurança Alimentar e Nutricional
- IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
- IBRADES – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento
- IMDH - Instituto Migrações e Direitos Humanos (Brasília-DF)
- MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos
- MST – Movimento Sem Terra
- Pastoral da Criança
- Plataforma DhESC Brasil – Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais
- POLIS
- Setor Pastoral Social da CNBB
- SINFRAJUPE – Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia.
- Sociedade do Sagrado Coração de Jesus
- WANAHR – Wolrd Aliance for Nutrition and Human Rights
- Warã Instituto Indígena Brasileiro
https://www.alainet.org/es/node/106195
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